Pânico

Dia normal. Movimentado. Três reuniões. Um café ali. Outro aqui. Pergunto sobre o filho de um colega na escola. Me perguntam sobre meu final de semana. Sento na mesa. E eis que lá vem ele. Começo a sentir a chama dele no meu peito. Eu o chamo de Abaddon, em homenagem a demonologia cristã. O demônio da destruição.

O coração acelera. E você sabe que ele vai dizer oi, caçando você como uma presa. Você se silencia. Diante dos trinta colegas de trabalho sentados naquela sala, você tenta passar desapercebido. Em sua mesa, você fica quieto. Coloca as mãos no teclado. Inferno. Parece que seu coração vai explodir. Você começa a suar em bicas. Sua vontade é de respirar como se tivesse jogado 45 minutos de bola ou 10 assaltos no boxe. Mas você prende tudo o que pode. Respira normal como se nada estivesse acontecendo. Diz para você mesmo:

- Isso é falso. Você não tá morrendo.

E de novo:

- Vamos lá, garoto. Esse demônio é inofensivo. Conte até dez!

É hora de abaixar a cabeça na mesa e colocar as mãos no rosto, fingindo que está apenas cansado. Ótimo, você fechou os olhos. Agora parece que realmente o poço vai te fazer sucumbir. Seus músculos contraem. É hora de levantar.

Reunindo toda a força que você tem, você levanta respirando como se não estivesse numa batalha entre vida e morte, tenta sentir seu coração não explodindo, e caminha em linha reta até o banheiro mais próximo. Sorri para três ou quatro pessoas no caminho. Lá vem o Coutinho ao seu encontro. Dois papéis na mão. Ele precisa falar com você. Nessa altura do campeonato sua camisa já está começando a ficar molhada. Ele acena pra você.

- Ei cara, preciso de um... Tá tudo bem?

- Tá sim, só vou rapidinho lavar o rosto no banheiro e te encontro em cinco minutos.

- Beleza! - Tapinha nas costas.

Ele não percebeu. Ou percebeu. Não me importa. Eu só quero nesse momento saber que vou continuar vivo.

Me tranco no banheiro. Apoio uma mão na parede e a outra eu coloco no rosto.

- Passa inferno! - Ofegante que nem um cachorro sem água.

O tempo parou naquele banheiro. Na verdade foram menos de cinco minutos. Cinco minutos aonde? Jupiter?

Lavo o rosto. Nada aconteceu.

Esta é a crônica de milhares e milhares de pessoas ao redor do mundo.

Marcello Morettoni
Enviado por Marcello Morettoni em 18/04/2017
Reeditado em 18/04/2017
Código do texto: T5974131
Classificação de conteúdo: seguro