DIATRIBES

Posso apostar e ganho, que alguns leitores correram ao pai dos burros, buscando o significado da palavra-título deste texto, enquanto outros preferiram lê-lo, imaginando que seja explicativo quanto ao tema. Há, no entanto, uns poucos eleitos da divindade, que se apartam dos comuns e parecem ter um dicionário na mente, jactando-se em diatribes por aí afora.

Para aqueles que, como eu, ignoram vernáculos incomuns ou pouco utilizados, aí vai:

Diatribe - escrito ou discurso violento que critica ou acusa alguém, catilinária, injúria.

É claro que acho lindo ler versos de Castro Alves, Bilac, Bandeira e outros floreadores eruditos de nosso idioma, assim como é gratificante conhecer clássicos da literatura mundial, mas temos de reconhecer que nossa civilização, assim como atravessa período de turbulência terrível, apresenta status de transição para muitos valores e costumes, e não só na literatura.

Ao mesmo tempo em que a tecnologia torna mais complexo o entrosamento com o meio e as pessoas com quem temos de interagir, também parece que caminhamos para uma grande simplificação de iniciativas e atitudes, em que o tom predominante é objetividade, imediatismo, em detrimento de formalismos e convenções, que se tornaram obsoletas.

Sáo muitos os que preconizam o fim do mundo, a derrocada final civilizatória, mas creio que, apesar dos imensos problemas cotidianos deste orbe, sempre teremos como seguir em frente. Pode ser que muita coisa ruim ainda aconteça, mas em meio ao caos enxergo muitas boas almas tentando ajudar, mentes privilegiadas inventando e desenvolvendo novos conceitos ou mecanismos, que alavancarão o suporte existencial humano, e isso me anima muito.

Desde meados do século vinte, muitas regras, convenções, tradições e crenças sociais têm sido demolidas, desconfiguradas ou, simplesmente, ignoradas, para dar lugar a ideias mais arejadas, abrangentes, que unam todas as etnias, gêneros, religiões ou ideais em torno de um senso comum, que sem prejudicar o caráter particular de cada um, encontre meios de atender às necessidades de todos, evitando exclusões e discrepâncias desniveladoras.

Infelizmente, ainda há muitos bolsões conservadores e refratários ao novo.

Mesmo aos trancos e barrancos, caminhamos para uma sociedade mais igualitária.

Hoje ainda vemos os auto-rotulados de direita e esquerda brandindo impropérios, uns contra outros, e é visível o quanto estão ambos equivocados, em relação a muitas coisas. Mas quando cessarem as infindáveis e inúteis diatribes que protagonizam, é possível que estejamos nos encaminhando a outro cenário, muito diferente do atual, em que se prefira fazer algo para alguém ou uma comunidade, ao invés de criticar os que não fazem ou fazem de modo diferente e, aparentemente, errado. Não nos cabe julgar a atitude alheia, porque não há um sequer, entre nós todos, neste planeta, que esteja livre de erros, mesmo que se considere certo.

Todas as pessoas que se projetaram, ao longo da história ou nos dias atuais, de forma positiva, agiram, desapegadamente, em prol de outros, sem se importar com críticas e evitando polemizar. Os que se destacaram por atitudes ousadas, porém polêmicas ou duvidosas, estão sempre vivendo num limbo de reconhecimentos, ora positivos, ora negativos, e tendem a ser esquecidos pelas gerações que virão, mesmo que pareça, presentemente, o oposto.

Muitas figuras do passado, quando lembradas por qualquer motivo, costumam ter em realce alguns poucos pontos positivos e muitos negativos, com raras exceções. Isso tende a acontecer cada vez mais, em parte porque somos tendentes ao erro, em muito maior grau que para o acerto, mas também porque durante as últimas décadas, muitos recursos foram criados e aperfeiçoados, para garantir a preservação dos registros de dados históricos. Com isso tende a deixar de existir a “interpretação” ou o “revisionismo ideológico”, que costuma distorcer toda a realidade original dos fatos, em favor da visão particular do historiador ou da moda acadêmica.

Tenhamos em mente que quem grita, agita, ameaça, critíca, jacta-se de fazer e desfazer coisas importantes, considera-se especial e exemplar, é figura retrógrada, que representa tudo que de mais rançoso existe neste mundinho social ainda tosco, em que vivemos.

O ser social arejado, preparado para forjar o futuro, é humilde, sensato, objetivo, quieto, respeitador, evita discussões, mesmo que esteja atento ao que acontece, jamais prejudica um semelhante, por atitude ou palavras, e não participa de nada que suscite agressividade, imposição ou prejuízo, de qualquer natureza, a outrem. É sereno e pro-ativo em tudo que faz.

Conveniente será evitar diatribes e acalmar os ânimos, refletindo acerca do que mais vale no dia a dia. A verdade não caminha no fio da navalha, mas na paz da sensatez.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 07/05/2017
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