Uma Palavra sobre o amor.

É ousado falar do amor, diria mesmo, temerário. Sobre o amor já falou-se tanto que quase tudo já foi dito. Mas aqui vale o não dito, porque o que não se disse ainda é maior do que o dito. Por exemplo, o amor destrói; amor é uma fraqueza que nos reduz a quase nada; o amor é um vício da alma; o amor é uma obsessão; o amor queima, arde, trucida a mente sã. Sobre cada uma destas afirmações poderia ser escrito um livro.

Mas poderia se afirmar, não sem alguma razão: mas isto não é amor, é paixão, ou seja, exatamente o seu contrário. É o amor por si mesmo, egocêntrico, que levado ao paroxismo, deixa de ser amor, que sempre pressupõe a primazia do Outro ou da Outra. É o seu lado negro , a sua deformação quando sentido por uma alma doentia. Então pergunto: o neurótico não ama? O psicótico não ama? Diria: ama à sua maneira. De uma maneira limitada, por vezes cheia de ódio inconsciente, ainda que intensa, às vezes demasiado intensa , ao ponto de levar ao crime. Quantos mataram em nome do amor? Pois o amor é um reflexo do ser. E como somos contraditórios, ele o é também. E como somos imperfeitos, ele o é também, e se formos perversos , ele o é também. Ou será que o amor só pode ser sentido por uma criatura luminosa? Se for verdade, é um sentimento raríssimo, privilégio de alguns poucos. Será?

Isto sugere que , a cada nível de aprimoramento interior, se projeta no mundo , um dado nível do amor.

Eu, que estou velho e estou amando, e que me apaixonei tantas vezes ao longo da vida – Graças a Deus! Porque mesmo assim, cheio de limitações, e intensos sentimentos contraditórios, é muito bom - percebo que quanto mais amo, mais vejo a morte diante de mim. Pois a vejo com medo, e a cada dia que passa, com mais medo, porque mais próximo da partida, quando deixarei para trás a todos que amo. Diria o cético: este medo é uma ilusão, porque depois de morto não sentirás mais nada. Serás igual ao que eras antes de ter nascido – ou seja, nada. Lembras-te de alguém da época em que ainda não eras nascido?

Acontece que me apego à idéia de vida depois da morte, acredito que nossa alma seja imortal; e assim sendo, continuará amando, só que à distância, em outro plano. Virá o desapego. E amará com plenitude, porque livre das injunções da vida neste planeta. É a minha esperança. Será uma esperança vã? Acho que nunca saberemos por que nunca ninguém voltou para contar.