O tempo... Ah o tempo

Às vezes me sinto estranha....meio sem propósitos, sem expectativas...isso me bate forte. E dá uma vontade de mudar tudo: Mudar de trabalho, de endereço, de cidade, mudar meu jeito, minhas roupas, meu cabelo, minha cara...

Na verdade não sei bem o que me falta, mas alguma coisa falta... Esses dias cinzentos de uma primavera ainda quase sem flores, me fazem lembrar de outras primaveras, outros verões, outros invernos... Mas não é a estação. Sou eu! Não é o tempo, com certeza. Não são as flores, ou a falta delas, sou eu.... Ou é a vida?
A vida passa sem graça, um dia após outro e eu me perguntando: o que me falta? Um amor? Um novo trabalho? Aquela viagem que eu sempre quis fazer e sempre adiei? O que me faria sair dessa monotonia, desse tédio que se instalou na minha vida de repente, que me faz olhar prá trás e procurar ( simplesmente prá recordar) uma lembrança boa da infância, um momento inesquecível de amor, um banho de chuva, uma confidência ao pé do ouvido com aquela "melhor amiga" que há séculos não vejo. 

A vida vai nos tomando as coisas. Primeiro dá. Depois tira. As pessoas vão acontecendo na nossa vida sem que nos demos conta do quanto um dia iremos sentir falta delas. Aquela "melhor amiga", o pai que se foi, o namoradinho do ginásio, os irmãos que moram longe, aquela amiga que nem era tão amiga mas que nos ouvia tanto, aquele cara que nos adorava e que nós não suportávamos, o primeiro amor, o segundo amor, o terceiro amor... O primeiro amor se foi, o segundo amor se foi, o terceiro amor se foi, mas o amor ficou! 

Nem sei porque me espanto. Isso sempre aconteceu comigo e sempre bateu assim tão forte que eu nem fui capaz de enxergar todas as primaveras, todos os verões. Eu nem fui capaz, quando me sentia assim, de sentir todo o frio que os invernos trouxeram, todas as faltas que as ausências me impuseram, todo o tesão que as paixões suscitaram, todas as lágrimas que as perdas deixaram... 

A vida sempre foi prá mim como um jogo de perde e ganha. Prá quem não é ? Num dia alegrias insanas, noutro tristezas inenarráveis. Ou melhor, talvez eu esteja sendo injusta, as alegrias e tristezas podem até algumas delas terem durado semanas, meses... Eu confesso: não lembro bem. Às vezes tenho a impressão de não ter visto o que me aconteceu em determinados momentos. De como eu era aos 20 anos, do que eu fazia aos 25, de quem estava comigo aos 29, de como eu usava o cabelo aos 30, onde eu estava aos 34, 36....????

Hoje, aos 39, eu sinto que o tempo foi passando pela minha frente sem que eu o impedisse, (como se eu pudesse!) sem que pelo menos eu o fizesse se deter em alguns momentos dizendo: "Ei, pára um pouco, deixa que eu viva um pouco mais desse momento, deixa que eu segure entre os dedos um pouquinho essa alegria, deixa que eu viva de verdade e intensamente essa dor, prá que ela não volte depois, misturada a tantas outras dores, que você tempo, vai sempre me trazendo!!" Sei que ele, irônico e fugaz não me ouviria mesmo. E seguiria como segue sempre, levando as primaveras e os verões, os amores, as paixões... Só não pensei que mais irônico ainda ele pudesse ser, (o tempo), e quisesse certificar-se de que eu sabia realmente de que ele nunca volta atrás....Até disso ele foi capaz!! 

E agora, quase aos 40 anos ele me vem com essa: me traz uma paixão de 20....Vinte? Não importa se 20, 21 ou 23.....Aos 20 e poucos tudo é primavera ainda.... E eu, como sempre desconexa, já estava no outono seguinte...
Olhei na janela e descobri porque não enxergava as flores. Olhei no espelho e quis me descobrir menina ainda, prá viver essa paixão. Foi quando descobri que o tempo há muito já havia levado aquela menina de 20 anos ....O espelho e o vidro da janela...Ambos mostraram os reflexos dos anos que o tempo me roubou.
E eu confesso: chorei...

Escrito em 2002