SESSÃO CÍVICA

Já cantava Belchior, o Grande:

“Vou viver as coisas novas que também são boas”

Lembro-me que em minha infância em Santa Maria, na escola, um dia por semana era reservado para a Sessão Cívica. O que era? Explico. Naquele dia as aulas eram mais curtas, de 45 minutos passavam para 30. Saiamos mais cedo, íamos para o pátio, em fila, cobríamos. Explico novamente: Cobrir era marcar uma distância regular na fila, com o braço esquerdo esticado apoiava-se a mão no ombro do colega da frente. Desta forma mantinha-se certa regularidade de posições.

A sessão cívica iniciava-se com a execução do Hino Nacional, todos cantávamos. Naquela época sabíamos cantar o hino.

Era lido algum texto, apresentado algum jogral. Jogral? Explico no final deste texto, no asterisco.

Comemorava-se algo, cantava-se mais algo, poderia ter a apresentação de algum teatro feito pelos próprios alunos.

Sessão Cívica era bom, afinal íamos pra casa mais cedo.

Pouco sabíamos, mas mesmo não gostando aprendíamos algo fundamental para toda a vida , o respeito pelas coisas que merecem respeito e o amor pelas coisas que devemos amar.

Alguns anos depois, logo após me formar, fui trabalhar como dentista no Exército Brasileiro.

Fui milico por dois anos, não me arrependo, experiência única.

Certa manhã chegando na 6ª Brigada de Infantaria Blindada, unidade em que eu servia, estacionei o carro bem em frente, desci chaveei a velha Brasília 76 verde do meu pai, quando fui atravessar a rua ouço o início da execução do hino que me era familiar e o hasteamento da bandeira brasileira. Não tive dúvidas.

No meio da Avenida Borges de Medeiros (ela não tinha canteiro), oito horas da manhã, um trânsito típico de cidade grande, encontrava-me eu, estático, em posição de sentido, batendo continência e cantando baixinho o hino Nacional Brasileiro.

As coisas novas também são boas, mas cultivar velhos hábitos, quando comprovados sua eficácia, é imprescindível.

Foi o passado que moldou as bases do presente e encontraremos fortes vestígios dele em nosso futuro. O que não deu certo acaba por sumir na seleção natural das coisas. O que é bom fica, ou pelo menos, deveria ficar.

Em que parte da história o Brasil se perdeu? Em que momento começou a soar algo natural usurpá-lo sem remorso algum?

Tudo bem, roubar sempre roubaram, muitos dirão. Mas nunca com tamanha gana e voracidade.

Quando o leão e a hiena lutam, não o fazem para salvar o indefeso antílope, como numa disputa de mocinho e bandido, do bem contra o mal. Ao contrário, lutam para ver quem vai devorar sua carcaça agonizante primeiro. Não há compaixão.

Quando perdemos nosso país? Quando paramos de respeitá-lo como um lar transformando-o numa imensa savana, repleta de antílopes agonizantes e indefesos esperando serem devorados pelas hienas que hoje rondam por entre nós.

*Jogral: Semelhante a um coral, só que ao invés de cânticos, é um coral falado, mas falado dentro de uma ordem, o que confere uma musicalidade e ritmo à declamação.