A REAÇÃO AO TROPICALISMO

A REAÇÃO AO TROPICALISMO

O desejo de promover transformações, uma característica da geração dos anos sessenta, alcançou as mais diversas manifestações da cultura e das artes. Foi o que aconteceu com o “tropicalismo”, movimento nascido na Bahia, por inspiração de Gilberto Gil e Caetano Veloso, no campo da música; Glauber Rocha, no cinema; Hélio Oiticica, nas artes plásticas e José Celso Martinez, no teatro. Propunha-se, abusando da irreverência, da ousadia e da inovação, criar uma nova identidade cultural no Brasil, fugindo a regras, preceitos e convenções conservadoras.

A juventude, engajada nas lutas políticas, reagiu compreendendo que se tratava de um movimento alienado, descomprometido com as causas sociais. Os militantes de esquerda acusavam os tropicalistas de tentarem desviar a mocidade do ativismo político.

O tropicalismo, então, provocou acalorados debates. Uns assumindo seu ideário, outros combatendo e censurando sua forma de atuação, por inoportuna e desvinculada das motivações políticas do momento. Muitos não entenderam que ele trazia na sua concepção um projeto revolucionário, buscando mudar mentalidades, na intenção de fortalecer o sentimento de recusa à nossa condição de subdesenvolvimento, adotando um comportamento crítico à cultura oficial. A ordem era transgredir, sair da passividade, radicalizar na posição de vanguarda, sem ficar restrito ao protesto político contra a ditadura.

Essa desaprovação de alguns, principalmente dos mais apaixonados militantes da esquerda estudantil, fez com que o movimento passasse por incidentes desagradáveis. Fui testemunha de um deles. O Grupo Trapiche realizava um debate sobre o tropicalismo, no auditório do Liceu, em 1968, quando repentinamente seus principais defensores, Marcus Vinicius de Andrade, Carlos Aranha e Jomard Muniz de Brito, foram atingidos por ovos podres jogados pela platéia. Esse acontecimento teve ampla repercussão nos meios intelectuais, artísticos e políticos de nosso estado. Ocorrência igual se deu por ocasião da apresentação da música “É Proibido Proibir”, de Caetano Veloso, em São Paulo, durante o III Festival Internacional da Canção, o que ensejou um discurso raivoso do compositor, questionando se era aquela a juventude que se dizia querer tomar o poder.

Estive presente também ao lançamento do manifesto dos tropicalistas paraibanos na FAFI – Faculdade de Filosofia, com a participação de grande público. O documento trazia as assinaturas de figuras conhecidas do mundo artístico, cultural e jornalístico da nossa província. Dentre outros eram seus signatários: Carlos Aranha, Marcus Vinicius, Jomard Brito, Wills Leal, Martinho Moreira Franco, Raul Córdula. O evento contou com a animação do conjunto Os Quatro Loucos que tocou canções de Gil e Caetano.

O tropicalismo teve vida curta, mas criou uma nova maneira de fazer cultura no Brasil.

• Do livro “INVENTÁRIO DO TEMPO II”, em elaboração

Rui Leitão
Enviado por Rui Leitão em 16/11/2017
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