PRA SEMPRE - Kenne Dy Maquine

Se as lembranças me traem, meu coração não. A cadeira de varanda sempre no pátio de onde se ouvia sua voz rouca, que irrompia estrondosa os comandos da casa. Cheguei na surdina, arriscando reproduzir esta cena – ela acordava cedo, pontualmente às 5:00 da manhã, sem exagero, às vezes acordava o galo antes de cantar dando comida para os patos e as galinhas, mas dessa vez não aconteceu.

Sempre trabalhadeira como dizia a vizinhança. Mãe de 12 filhos abandonados pelo meu vô, seu primeiro marido. Maria chorou ao ter que levar 5 dos filhos, os maiores, para o internato, ficando com os outros 7 para cuidar. Disseram que na beira do Igarapé lavou muita “roupa pra fora”, mas só vivi pra saber que quebrou muita castanha na fábrica para criar seus filhos.

O sol demorou a raiar, parecia travar com a noite uma luta sem fim. Sentei-me na cadeira, fui surpreendido pelo inquiridor olhar dos animais, que me cercaram como se perguntassem: cadê a Dona Maria? O café cheirava forte, fui magnetizado na sua direção.

Quando “o tempo fechava” ás vezes não tínhamos o que comer, recordo, na minha infância, meu pai concluir: vamos na sua vó que se tiver um peixe ela divide e dá pra todo mundo. Cheguei à garrafa de café, estava frio, sem o gosto de costume. Não consegui decifrar o enigma- flores no chão da sala, silêncio, ninguém.

Maria não era de muita cultura, mas de uma sabedoria divina. Certa vez gritou ralhando – Kenas, era assim que ela me chamava, asseverou - nada de brincar de manja com essas meninas! Na hora disse sim vovó, mesmo furioso sem noção do perigo. Hoje encontro as “caboquinhas” todas moças, algumas casadas, mas todas feias e me pego sorrindo lembrando do ocorrido pensando olha do que me livrei!

A canoa virou, uma moça cai no rio fundo, sem muito pensar alguém mergulha atrás e consegue puxa-la pelos cabelos. De pouco sorriso, mas de grande ternura e coragem vovó insistiu em viver a felicidade de seus filhos, netos e tataranetos. Acordei muito triste, e chorei percebendo que apenas foi um sonho onde buscava viver você querida vovó. Do abraço e do sorriso é que me lembro mais.