No barzinho soturno



Barzinho soturno em Madureira com Maria Augusta, próximo a sua casa, a duas esquinas do rio Feliz. Barzinho soturno, mas pelo menos sem música barulhenta nem televisores ligados em novelas — podia-se conversar a noite toda de maneira civilizada.

Pedi minha indefectível água tônica (sem cubos de gelo nem limão), enquanto ela, espantosamente fiel aos tempos da Aliança Francesa — já se contam quase trinta anos —, ia de cerveja e pepino. Não riam. Maria Augusta não bota uma gota de álcool na boca sem ter junto de si um pratinho com rodelas finíssimas de pepino, ou cucumis phallus, disse-lhe eu, na classificação escatoterapêutica de Freud.

Essa não era nova para minha amiga. Limitou-se a sorrir e mudar com delicadeza de assunto, corando um pouco. Bom sinal. De qualquer modo, eu não estava ali para reconquistar nenhuma paixão da juventude. Já que a Internet propicia, muitas vezes pela mais pura casualidade, este ou aquele reencontro essencial, não quero outra vida senão me esbaldar sentimentalmente com pessoas amigas que tinham sumido do mapa sem deixar rastro, e que agora ressurgem por artes da grande rede.

O lance do pepino, por exemplo, foi uma senhora evidência de autenticidade. Assim que a parceirinha de copo deu a primeira mordida numa rodela, salivei os lábios como um vira-lata ansioso e faminto, lembrando-me do nosso primeiro beijo nos jardins da Aliança do Méier, depois de alguns chopes com o tal tira-gosto num boteco da rua Oliveira.

Não lhe contei nada a respeito. O importante era que estávamos naquele barzinho soturno como bons companheiros que nunca se tivessem separado, sem o menor fiapo de estranheza, cada qual curtindo com delicia a cara do outro. A dela, linda.