A CHUVA

Os pingos descendo ligeiramente do céu abandonavam as nuvens escuras e pareciam tão sonoros quando tocavam os guarda-chuvas que em coro abriam-se em infinitas cores e listras. Algumas gotas que escorriam colidiam com o asfalto íngreme que as levava por entre suas fendas meio escuras e sujas, até que elas se misturassem aos calcários negros. Outras pobres pequenas esmoreciam entre para-brisas que dançavam de um lado a outro na ilusão de fazer parar de chover em suas vidraças límpidas e transparentes. Mas há ainda aquelas que em seu percurso efêmero depararam-se com dois desavisados. Aqueles que, sem a menor resistência, encontravam-se sob os chuviscos de um domingo à tarde depois de um dia ensolarado. Escorrendo pela pele elas percorriam a superfície ainda quente, descompondo a elegância de um vestido bem alinhado e encharcando um pobre par de sapatos. Algumas gotas se encontravam quando duas mãos se tocavam; invejando-as as outras escorriam rapidamente com a intenção de segui-las, e no trajeto topavam com alguns sorrisos meio bobos que surgiam assim meio do nada. De repente, as pequenas dançavam sem saber o porquê, esbarravam umas nas outras enquanto os dois corpos protagonizam delicados giros pela cidade banhada. A chuva aos poucos ia parando, as nuvens iam clareando e os pequenos pingos findando seu ciclo. Os guarda-chuvas escondendo suas cores e listras, e sobre a calçada dois corpos esguios e encharcados caminhavam enquanto pequenas gotas escorriam para o fim de suas jornadas.

Quel Moura
Enviado por Quel Moura em 20/01/2018
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