à sua loucura

“Me avise quando chegar em casa” – disse. “Se chegou bem”. Eu tinha acabado de assistir Nise – O coração da loucura, e estava já na porta quando vi a mensagem. Embora houve a proposta de assistir novamente o filme só para me fazer companhia, eu optei pela minha loucura sem opinião. Eu passo mal em filmes de guerra e histórias reais que contam injustiças, passo mal com muita coisa. Não sei se já sabes disso ou se talvez por isso sugira filmes com histórias de lutas que deram certo, ou talvez ainda ache isso bonito e queira apertar a minha mão quando me sentir tensa no cinema ou em qualquer outro lugar. Não sei. Eu segurava mais choro. Hoje menos. Mas gosto de ter minhas mãos envolvidas por outras de qualquer maneira. Pessoas não possuem manual de instruções e por isso eu as perdoo. Às vezes. E me perdoo na mesma proporção. Ou não. Mas sem depender do quanto tenho lidado bem ou mal com os humanos, eu dei uma sofrida na cena da solução adotada pelo hospital psiquiátrico em relação aos bichinhos de estimação. E me comovi com as palavras da verdadeira Drª Nise da Silveira. Fiquei questionando onde, de fato, havia loucura. Se talvez em avisar se cheguei bem em casa, de ser carinho, de ser humana, de ser distante mais do que eu gostaria e de saber o quanto essa autodefesa inútil me perturba mais do que imagina, e me faz cair em casos rasos mais do que imagina, e me faz repetir palavras.

Eu quis abraçar meu cachorro por admirar o quanto eles são capazes de não odiar e achei isso bonito. Tive saudades antigas e novas: do arroz temperado que eu comia na escola e da pessoa que conheci mês passado e permaneceu inteira na minha vida apenas por uma semana, e saiu.

“Cheguei sim” – Respondi antes de girar a chave. “E bem”. Talvez não seja ainda a hora de dizer que tenhas vindo comigo. “Amanhã falaremos sobre o filme”. E quem sabe, sobre minhas teorias de mundo – suspirei com a obrigação da gentileza, mas sem nenhuma certeza sobre quem eu verdadeiramente quero na minha loucura, amanhã.

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*Textos de Quinta - Para fugir da responsabilidade.

Um a cada quinta. Não é promessa, é desejo =)

Marília de Dirceu
Enviado por Marília de Dirceu em 15/03/2018
Reeditado em 15/03/2018
Código do texto: T6280314
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