SER PERFEITO

Não busco o compasso simples nem o composto, nem o tempo certo para alcançar a nota perfeita. Não quero ser o tenor que alcança o Lá 4, nem busco o soprano de que consegue num falsete alcançar o Dó 6. Para minha melodia deixar minha música com o melhor dos estilos, não me basta impingir o timbre ou a intensidade de um músico experiente e consagrado. Hoje sei disso, pois vivendo errante com uma viola dentro de um saco amarrado nas costas, cantando aqui e ali, procurando alguém que queira me ouvir, sem nenhuma exigência de estética própria em perfeita sinestesia.

Por muito tempo exigi de mim a perfeição de que todos esperam para que uma boa música pudesse ser ouvida. Por muito tempo vaguei de lugar em lugar, de bar em bar, de um ponto ao outro, por entender que ainda não estava pronto para brilhar. Em cada caminho que busquei a perfeição, marcas deixei, amores poupei, amizades larguei e sozinho fiquei. Saudade foi o sentimento que mais me acompanhou. Decepção o que mais pude presenciar e arrependimento o que me fez voltar atrás e recomeçar com apenas uma nota que durasse a vida toda, uma semibreve que quase não é usada.

Em busca da perfeição esqueci de viver. Esqueci que o tempo passa e não volta mais e que cada recomeço não me trará os prazeres que outrora não me permiti desfrutar. Se magoei, se não perdoei, se me fiz de coitado, se fui duro, se fui o senhor da razão, se minha verdade era a única verdade, que pena, pois perdi a oportunidade de ter vivido a vida como ela deveria ter sido vivida.

Essa minha constante busca pela perfeição, por tentar fazer os outros enxergarem o que somente meus olhos enxergavam, ou por fazer o que os outros quizessem que eu fizesse, me causou um vazio no peito e na alma. De que valeu a pena ser perfeito? Só serviu para descobrir que sou imperfeito e me frustrar diante da nítida descoberta. É a imperfeição que nos impulsiona para frente, que nos faz ser verdadeiros seres humanos, que nos aproxima um do outro com a esperança de ser feliz e de ser sempre amado. Reconhecido não pelo que se tem, mas pelo que se é. De ter uma única certeza: não precisamos da perfeição para alcançarmos a plenitude, precisamos de sensibilidade para aprender simplesmente as sete notas musicais.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 27/03/2018
Reeditado em 30/03/2018
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