LEMBRANÇAS DE SEXTA FEIRA SANTA


29 de março de 2013 
E , novamente aquela perguntinha indiscreta do facebook:
“Em que você está pensando Joel?”
Então,senhor Face,pegaste-me ruminando algumas lembranças .
Manhãs de sexta feira Santa,pinhões de São José,chimarrão e café,marcelas,alecrins,ervas de cheiro...
Cestas,afilhados,pedidos de bênçãos,orvalhos matinais,madrugadas,pomares,
Ervas ardendo em braseiro,fumaça “bendita” pelos quintais,respeito,aconchegos...
Isso tudo para tentar reviver algumas tradições cultuadas por meu saudoso pai.
Nas manhãs de sexta feira da Paixão,ele despertava muito cedo. Em silêncios entrecortados por cantigas de galos (que costumavam soar mais tristes naqueles dias,segundo suas constatações) e muito antes que o dia raiasse,aquela figura solitária,no exercício pleno de sua fé fazia uma incursão pelo quintal e redondezas,colhendo ervas de cheiro.
Era fundamental que estas mantivessem o orvalho da madrugada.Cuidadosamente ele as colocava numa cesta de vime,deixando-as num canto qualquer da sala.
Dizia a tradição,que ervas colhidas nestas condições preservavam algo de “bendito” .
Assim, usadas em chás ou infusões o efeito seria quase milagroso.
Se incineradas,agiriam como incensos purificadores de ambientes.
Feito isso,punha-se à espera de seus inúmeros afilhados.Era de costume naquela data, pedir –se a benção aos padrinhos logo pela manhã.Eles iam chegando aos poucos e de repente a cozinha estava repleta.As conversas eram conduzidas com muito respeito,e regadas à café,chimarrão e os famosos “pinhões de São José”,assados em chapa quente.
Ao redor do fogão à lenha aquele senhor era todo afeto e à cada afilhado que despedia-se era oferecido um pequeno ramalhete das “ervas benditas”,orvalhadas ainda.
Naquelas manhãs de outono,reinava uma doce serenidade.
À tardinha,as sobras do ano anterior,eram queimadas em braseiro e os quintais pela vizinhança (até por que a tradição era seguida à risca pelo vilarejo) exalavam relaxantes odores de marcelas e outras ervas.Uma tênue cortina de fumaça incensava os ares e na simplicidade de nossas vidinhas pacatas ficávamos à espera do domingo de Páscoa.
Cresci convivendo com esse cenário e confesso-me saudoso de tudo .Não sei exatamente o que atribuir ,ou como qualificar as atitudes de meu pai .Basta-me a lembrança daquele seu jeito respeitoso,daquele seu olhar de carinho dando-nos,aos afilhados e à mim,uma “benção diferenciada” naquelas manhãs que lhe eram especiais .
Finalizando,senhor Facebook,digo-lhe de minhas reminiscências que evocam ternuras antigas,desbotadas pelo tempo.Num tempo de afetos,de aconchegos,de cozinha ampla,recheada de vozes ,cheirando à marcelas,alecrins e pinhões de São José.

Joel Gomes  Teixeira