Viúvas da Ditadura: fascismo e nazismo em Ponta Grossa 2018

3 de abril de 2018

Fui buscar janta no Carlittos, frente ao Terminal Central de Ônibus, por volta de dezenove horas. De longe escutei como que uma pregação, a entonação de voz parecia de um pastor. Era. Me aproximando por ser caminho, sem me deter no espetáculo, cinco coisas me chamaram a atenção, um pastor evangélico semi-analfabeto, um senhor que se identificava como ex-petista, portanto, assumindo doutorado em ciência política e sobre socialismo, um jovem anarquista que tomou a palavra e discursou contra o fascismo, dois professores universitários cujos conhecimentos em ciências sociais se notabilizaram sempre pela mediocridade e uma centena de homens e mulheres brancas, de caras pintadas, cãs salientes, fazendo cena e circo.

O pastor foi o primeiro a falar, talvez porque é preferível deixar os menos qualificados, os analfabetos funcionais, os destituídos de argumentos, darem as boas vindas e fazerem a primeira parte do cerimonial do ridículo, porque qualquer iditiotice, será consertada depois, pelos mais experientes em engenhoca. O pastor alertou as pessoas para os riscos do comunismo, do petismo, que com base nos livros e teorias que nunca leu nem se aprofundou, são compartimentos do satanismo. O mesmo discurso das senhoras, as viúvas da ditadura, em 1964, por ocasião da derrubada do Presidente Goulart. Não permitiram ao “homem de Deus” que falava da exploração da fé, do dinheiro arrecado dos mais pobres nos cultos e campanhas fantasiosas nas congregações, nem que justificasse porque toda a população brasileira tem que trabalhar para sustentar um indivíduo que não tem emprego fixo.

Na seqüência do discurso, um senhor, empafioso, encheu os pulmões de ar, para justificar a autoridade com que falaria sobre os projetos sociais do PT. Fora petista durante a juventude e aprendeu com os comunistas do partido a usar termos indecentes como “alienação”, “justiça social” e a idéia perigosa de “igualdade”. Sabia das artimanhas petistas, aprendera nas reuniões do partido, onde cansou-se de escutar que o objetivo das lutas da classe trabalhadora era transformar o Brasil em Cuba e em Venezuela. Gritavava, emocionado, “jamais seremos Venezuela!, a nossa bandeira é verde e amarela, igualdade e socialismo aqui jamais! Saibam responder quando forem chamados de alienados”. Lamentavelmente, nem o PT nem os professores de Estudos Sociais-Educação Artística desse senhor o ensinaram que, diversos países adotam o vermelho em suas bandeiras, sem serem comunistas, caso dos Estados Unidos, do Canadá, Inglaterra, Coréia do Sul, Japão e Austrália. Menos ainda que bandeiras não são dogmas e revelações divinas, o Brasil já mudou de bandeira, pelo menos, três vezes. Sendo uma mente cauterizada, uma personalidade que, provavelmente, não costuma ler nem a coluna do leitor dos jornais, não há o que possamos fazer. Já cruzou a curva da vida e foi-se o tempo e as condições propícias de aprendizado. É um caso clínico para a Psicologia da aprendizagem.

Nesse meio tempo, um jovem anarquista, excelente voz, capacidade de síntese brilhante, pede a palavra e os udenistas lhe passam o microfone, esperando, como os petistas fazem em suas manifestações políticas e são imitados pelos sindicalistas, que o discurso da massa, do povo fortaleça a impressão dos intelectuais. O moço descasca o cedro. “Vejo com temor, preocupação e indignação manifestação onde se evoca o retorno do militarismo, o saudosismo da Ditadura. Não há outro nome para isso, a não ser o reconhecimento de semelhança com a Alemanha nazista. Isso é um fascismo escancarado”. Como escreveu o General Nelson Werneck Sodré, a juventude é sempre revolucionária. Silêncio total. Com a janta em mãos volto para casa. Um senhor, cãs e linguajar de pessoa com pouca afinidade com os estudos e com a leitura, derrama ódio na praça. Tenta gritar, mas nem a voz nem o microfone ajudam, que se Lula é acusado, só pode ser culpado. A falta de lógica e honestidade conceitual na afirmação dispensa comentários. Creio que todos perceberam mas respeitaram a tentativa de um senhor de boa idade em se sentir o tal numa manifestação que lhe deu, talvez, os únicos minutinhos de glória.

Indo embora, deparo-me com dois rostos pintados de verde-amarelo. Um deles me percebe e tenta olhar em outra direção. Lembrou-se que quando minha professora na década de 1970 era conhecida na Escola por não comparecer na maioria das aulas e nas que comparecia, comprazia-se em falar mal dos governos militares (era hipócrita, pois na prática os defendia) pelo baixo salário de professora que alegava receber. Suas aulas eram pura enrolação, se é que mereciam o nome de aula. Uma outra figura que ali percebi, nunca verifiquei a veracidade das informações que vizinhos e conhecidos me passaram, mas diziam que se tratava de gente esperta, que foi ampliando os limites de sua propriedade para terrenos abandonados ou públicos até finalmente cercá-los. São estas as viuvas da ditadura que se reencarnaram entre nós, em 2018. Essa geração terá que morrer no deserto antes que o povo entre na Terra Prometida. São idólatras, egoístas e pensam apenas em si. São demônios que, em tempos de grande tribulação, sairam do Tartarós. Deus nos protega do patriotismo e do fascismo deles.