Corpo Estranho

Hoje, como em muitas outras vezes me senti estranho. Como se tivesse me deslocado para algum lugar, como se o chão em que piso não fosse firme, como se a janela a minha frente não fosse estática, como se o jardim lá fora fosse apenas uma imagem de filme, passando. Era estranho, como se pudesse trocar aquela imagem por outra qualquer, e assim fiz, troquei pela imensidão de um deserto de areia fina, tão fina, que se estendia até onde a vista alcançava, e nos seus meios havia água, lagos imensos onde de pura água cristalina, como um santuário em meio a escuridão. E me perdi admirando, a ponto de não sentir mais o chão, meus pés, descalços, era como se estivessem levitando, como estivesse num vácuo de imagens. Logo nem meu corpo eu reconhecia mais, parecia algo estranho, alheio, que eu estava meramente preso ali, agora já nem tanto. Como se através dos meus olhos eu pudesse sair a qualquer momento e passear pela imensidão do espaço. Num passo a frente, senti meu corpo ficar para trás, e quando o passo foi dado, o corpo veio como se tragado pelo espírito. Voltei. Foi estranha a sensação, mas foi de todo muito agradável, senti-me renovado, alegre como se, naqueles poucos instantes, tivesse renascido a minha alma.

Sentir-se estranho, não é sempre uma coisa ruim. Às vezes parece que não nos encaixamos no lugar aonde estamos, mas, o que nos faz permanecer é um desejo oculto de transformar o mesmo em nosso lar.