INSPIRAÇÃO

Chamo aqui a atenção daqueles que curtem as mais diversas criações do gênero humano e tomo a liberdade de destacar algumas delas: novelas, filmes, peças de teatro, composições, livros de vários autores, inúmeros clássicos da música que remetem a um passado distante e que ainda hoje tocam fundo nossa alma e emoção.

Cada um deles tem um ponto em comum, independente do autor; a inspiração. Ela é a responsável pelo seu riso, choro, pânico, terror, e um sem número de outras emoções que te envolvem sem pedir licença. Cada mente, por sua vez, filtra a seu modo a mensagem transmitida.

Quando você chega em casa, cansado, joga-se no sofá e aciona o controle remoto da TV para assistir a sua novela favorita; cujo capítulo mostrará a cena tão esperada envolvendo os personagens que te hipnotizam, irritam, seduzem ou provocam certos sentimentos, normalmente desconhece o rito dos bastidores do autor e da empresa responsável pela difusão daquela obra televisiva.

Voltando um pouco no tempo, contarei como um autor convive com a INSPIRAÇÃO ou a falta dela no trato diário do trabalho de criação. Na década de setenta/oitenta eu trabalhava como roteirista e ilustrador de Histórias em Quadrinhos na Redação Disney ou para alguns, Estúdios Disney Brasil. Sem dúvida alguma a Abril era uma das mais conceituadas empresas do meio editorial, até então.

Era divertidíssimo o meu trabalho, todos os dias eu chegava cedo, tomava o cafezinho da Dona Cida, lia alguns jornais e revistas, trocava ideias com os colegas sobre diversos temas, ria à beça, e fruto de toda essa interação, partia para a redação de mais uma história em quadrinhos Disney. Após as avaliações, ajustes e aprovação da chefia do departamento, o roteiro seguia para o ilustrador. Depois de finalizada, era chegada a hora da publicação em algumas das seguintes revistas da editora: Tio Patinhas, Zé Carioca, Pato Donald, Mickey e tantas outras. Será que era assim tão fácil criar? Nem sempre.

Havia dias em que eu não conseguia pensar em nada e tinha a cruel sensação de que havia perdido a capacidade criativa. Nesse momento dava um tempo. Tomava uma água, me acalmava e seguia para conversar com a Martinha do Arquivo Editorial. Lá ela me dava algumas dicas valiosas sobre determinada publicação que me ajudaria a resgatar a inspiração. Lia, sentia as vibrações criativas de um ou outro autor e na maioria das vezes, remoçado e motivado, retornava para meu “árduo trabalho” de fazer rir crianças e adultos mundo afora.

Anos depois, um novo desafio, trabalhando como cartunista do Jornal O Estado de São Paulo, a pegada era a mesma, porém com foco e ritmo diferentes. A inspiração dava o tom de todas as charges e cartuns que eu conseguia criar para cada uma das matérias em suas respectivas editorias.

Assim se manifesta a inspiração, surge do nada e de tudo, capturada nos detalhes da vida e nos relacionamentos mais singulares. Ela ganha corpo à medida que a desafiamos.

Na publicidade é que se cobra mais do criativo, vulgo diretor de criação, que tem por missão matar um leão a cada peça comercial veiculada, não podendo frustrar o cliente e em consequência, o consumidor, que no final absorverá o produto, fruto daquele processo criativo. É nesse momento que se entende a importância da inspiração. Se não houver a resposta esperada nos pontos de venda, o criativo (entenda-se a agência) deu com os burros n’água. Pior que tudo, o investimento do cliente inverteu as bolas e virou prejuízo, num estalar de dedos.

Dito isso, podemos concluir que uma obra criativa caminha de modo indissociável da inspiração, sob pena de ter como resultado um fracasso iminente. Criatividade, inspiração e persistência são fatores que, combinados, enriquecem as produções intelectuais de todo o mundo, é a engrenagem principal dessa máquina que nos motiva a todos, infinitamente.