A LÍNGUA PORTUGUESA E A AMAZÔNIA

Dá prazer falar de coisas que se harmonizam naturalmente. A língua portuguesa, o Brasil e a Amazônia. Sandy, simpático cidadão americano casado com a sergipana Clarinha, cursava doutorado em línguas neolatinas, na Universidade de Wisconsin, EEUU. Sabia muita coisa sobre nosso idioma bem como das chamadas línguas românticas ou latinas.

Dizia Sandy que a língua portuguesa cai como luva para se verbalizar a natureza, suas relações e seus fenômenos, enquanto o francês serve bem para a linguagem do amor, da afeição pessoal e das divagações poéticas. O Italiano encaixa-se muito bem nas manifestações cantadas que exigem sonoridade no prolongamento de vogais.

Além disso, a língua portuguesa falada no Brasil tem uma sonoridade especial, de fácil compreensão para o estrangeiro. Com base nisso, pode-se dizer que o escritor brasileiro não encontrará dificuldade para bem descrever nosso litoral, nossas lindas serras e, sobretudo, nossa exuberante Amazônia. O português bem falado ou bem escrito flui naturalmente como música aos que cultivam apreço e alguma intimidade com nossa bela floresta chuvosa. Que o diga o extraordinário Thiago de Mello. Além de poeta e escritor, teve a sorte nascer e crescer naquelas terras molhadas e sombreadas por generosas frondes. Quem por lá nasce e vive é, de matriz, abençoado por águas e plantas.

Aos de mente corrompida pelas fantasias brilhosas dos “shoppings” e das modernidades da agitação urbana, talvez não seja assim tão fácil sentir a Amazônia como ela é. Desfrutar da graça que permeia a Amazônia não é para quem a vê como um jardim botânico ou zoológico. Definitivamente, a floresta com seu chão úmido não é ambiente para se passear de bermuda e camiseta, a tomar fotos das inequações dos costumes da cidade.

Só se curte a região amazônica quando se interage com ela. Diria o poeta, quando se torna filho dela, ainda em seu útero, sentindo seus calores, cores, olores e sabores. Ou, se assim não for, quando se acha pequeno, aninhado em seu colo, ouvindo conselhos e aceitando puxões de orelha para conter ousadias e travessuras.

A Amazônia é, na verdade, um macro organismo vivo com anatomia e perfeita fisiologia a harmonizar suas partes e seus sistemas. Pode-se, por isso, considerá-la a obra mais fantástica do Criador no planeta Terra. E, por sorte brasileira, dada a viver ao Norte de nosso território.

Rios, igarapés e igapós compõem seu sistema circulatório. Conduz nutrientes a todas as partes e recolhe os rejeitos para levá-los ao oceano. Promove interação harmônica e funcional entre seus componentes. Sustenta a homeostase, isto é, o equilíbrio dinâmico de todo o sistema.

Como ocorre a qualquer ser, não lhe faltam parasitas, comensais, simbiontes, sapróvoros e inquilinos. Mas, todos na função e medida certas. O ser humano parece ser o componente mais complicado nesse sistema porque pretende ser o seu regente e aproveitador, quer na condição de parasita ou, no mínimo, de inquilino comensal.

O turista pode ser considerado um efêmero elemento no processo fisiológico. Assemelha-se ao alimento que não consegue ser digerido e sai como entrou. O imigrante ingressa e, de início, o estranhamento é mútuo. O organismo tende a rejeitá-lo por considerá-lo corpo diferente. Com o tempo e persistência, acaba por se acomodar e, com sorte, se integrar participando da fisiologia de algum sistema no organismo.

Incontestes parceiros simbiônticos humanos são os ribeirinhos nativos e os índios. Reconhecem-se efetivos agentes e pacientes do sistema. Vivem do que a floresta lhes provê. Não carecem de shopping nem de pegue-pagues. O alimento está no fácil alcance. O palmito de pupunha, ou de açaí, ou mesmo de qualquer outra palmeira. As raízes, frutos e folhas para lhes servirem de alimento e remédio. O peixe, a caça de cada dia. Dispensam estradas asfaltadas, as picadas lhes bastam. Nem fazem ideia do que é roupa da moda ou colchão de molas. Sabem aproveitar plantas verdes e suas cinzas para temperar o alimento. Até a água que aflora ou corre entre as folhas e gravetos no solo pode significar remédio para alguns males.

Enfim, índios e ribeirinhos não fazem mal ao sistema, ao grande organismo amazônico. Ao contrário, defendem-no e conservam o ambiente, considerando-o sua moradia.

Mal fazem os que destroem a floresta, desviam e represam cursos d’água. Fazem rios e remansos de esgoto. Pescam e abatem animais aquáticos predatoriamente e por diversão. Os garimpeiros que contaminam as águas e o ar com mercúrio. Em suma, são estes os parasitas patológicos, os macróbios infectantes do grande organismo amazônico.

É essa turma que quer destruir a graça e o sonho de se falar, sem pressa, dos encantos da natureza, usando a mais bela ferramenta para tanto que é a encantadora língua portuguesa.

Roberio Sulz
Enviado por Roberio Sulz em 04/08/2018
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