O ASSÉDIO DE SALIM

Luzinete, 23 anos, moradora de São Boatão, leste da Bahia. Mulher do tipo bela e bem provida. Desde muito cedo preserva suas partes para o bem do noivo que sabe que vem. Única rebenta da prole de 12 “menino” da Dona Marinalva e Seu Tenório, que sonham vê-la bem casada. Mainha Marinalva sempre alerta Luzinete sobre as “cantada dos moço”, mas ignora o sufoco da menina quanto a calores... tentações.

Mas Luzinete sofre pela abundância de curvas, só igualadas às do Rio das Fro, popular na região pela sinuosidade. Os matutos na lotação se apertam além da conta tentando tirar uma casquinha de Luzinete. Chega todo dia às oito em ponto na loja do turco Salim, que vende de tudo, até a mãe.

Sob olhares de baixo para cima do turco, apruma-se mirando a clientela, que vem cedo pela promoção do dia. Samira, mulher de Salim, nota que o marido de bobo não tem nada, mas se faz de besta focando as notas e moedas do caixa. Naquele dia a moça surge com uma saia de fazer o Papa perder a santidade.

Para alegria do turco Salim uma cliente pede à Luzinete a bandeja de xícaras do alto da prateleira. Ela prontamente sobe para pegar. Salim também sobe sem sair do chão. Seu queixo cai junto com o palito de dentes que meneia no canto da boca. Lá de baixo, o turco pode ver a bandeja, pires e todas as xícaras de Luzinete. A cliente finaliza a compra com Samira e sai feliz da vida com a nova aquisição.

Nesse momento Samira nota o “estado de animação” do marido e perde a compostura. Vai até ele e tasca um beliscão dos fortes, a ponto de fazer estalar polegar e indicador. Resmungando baixinho, volta para o caixa... e Salim para seus afazeres. Naquela noite a casa cai para o turco ante o esculacho de quilo da mulher que lhe desfere um ultimato: se não cuidar dos instintos, lhe capo na raiz.

Salim acoado, engole o imenso caroço de abacate da garganta e parte num praguejo, em direção ao quarto. No dia seguinte, tudo igual; o calor típico da cidade de São Boatão, Luzinete e suas partes, a lotação e Salim incorrigível, quase esbugalhando os olhos diante de uma Samira a ranger-lhe os dentes. O relógio apressado, o caixa da loja tilinta. “Quase tudo” sob controle.

Há vento e muito pó na loja. Seu Salim espana os produtos na prateleira quando, de súbito, uma forte rajada de vento levanta a saia da moça bem diante dele. Uma pilha de papéis depositados numa caixa voa e o turco, num segundo, estica o braço para contê-las. Sem sucesso ultrapassa os papéis e invade as baixas da saia de Luzinete, que grita alto e forte no salão.

Samira, vê a cena e parte para cima do turco. Outra cliente ruboriza e grita: assédio, assédio!!! Seu Salim com o susto, não suporta e sofre um ataque cardíaco fulminante. Bem próximo deles, alguém registra a cena num celular. Uma cliente fotografa o turco Salim morto no chão, ao lado de Samira e Luzinete.

Uma parte da foto do turco destaca um imenso volume sob suas calças que escandaliza a cidade. O ponto mais curioso da cena é a cara de felicidade do finado Salim. Samira tem problemas nos preparativos para a cerimônia de velório, diante da figura do turco e seu proeminente apêndice. Mas, um criativo marceneiro resolve a questão. A família isenta Luzinete de culpa pelo episódio, bem como os demais...

A bem da verdade, nesse fato, Salim não tem culpa. Samira, todavia, não tem a consciência da verdade. As redes sociais publicam imagens do turco tarado armadão. “O sacana paga por seu assédio”, desfecha Samira. O sorriso dele, contudo, permanece para sempre na internet, distintamente de outro, o de Monalisa, notoriamente na brilhante pintura de um tal Leonardo.