Maria Maratonista

Descobri que não sou tão sedentária quanto imaginei. Todos os dias sou maratonista e muitos ousarão minimizar o esforço. Mas eu não estou só, pois nesse percurso há outras mulheres cada qual com sua distância a percorrer e feliz daquela que conseguir alcançar a linha de chegada sem nenhuma marca de agressão física ou psicológica. Não há somente uma vencedora, pelo contrário, se uma perde, todas perdem. Com certeza não é uma corrida como outra qualquer, pois as participantes não são competidoras e cada uma delas se move pela intensidade do medo que carrega. Além disso, a jornada é tão natural que nem percebem que estão numa maratona, assim como antes de ontem eu não sabia. Mas todas somos inconscientemente “preparadas” para esse momento desde muito cedo: ao sair de casa, ande rápido, olhe para baixo e ignore. A largada é dada ao descer no ponto, mas a preparação psicológica – e até espiritual – começa ao pressionar o sinal de parada. Não temos padrão para roupas, mas se o nosso caminho se desvia, alguns telespectadores tendem a culpa-las. Quando os obstáculos automotivos aparecem, nossos passos tendem a apressar-se. Respirações ofegantes e olhares famintos pela chegada. Qualquer presença estranha nos abala. Se não convenço pelas palavras, convido a assistir ao espetáculo. Ele acontece a todo minuto. Dia, tarde, noite, madrugada. Basta esperar que ela desça do ônibus, saia de casa, caminhe pela rua, vá trabalhar ou volte da faculdade. Está dada a largada. Ver é gratuito, participar é mais dolorido. Mas caso perceba alguma irregularidade, não compactue. Disque 190. Essa corrida é nossa.

Natália Fonte Boa
Enviado por Natália Fonte Boa em 24/08/2018
Reeditado em 07/03/2021
Código do texto: T6428559
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