Regime semiaberto

O Sol bate na janela. Hora de acordar. “Pular da cama”. Escovar os dentes. Tomar banho e se der, um cafezinho.

Trânsito ... no ônibus ou no carro. Chegar no trabalho, bater o ponto e iniciar as atividades rotineiras do serviço.

12:00 – Almoço: marmita, self service para os mais privilegiados, uma coxinha quando não dá tempo de fazer uma refeição decente.

13:00 – Retorno ao cansativo, e agora, enfadonho serviço, porque o turno da tarde sempre demora mais a passar.

Relógio – objeto mais espiado durante este período, e como não anda, o tempo parece parar.

Finalmente 18:00 – bater cartão novamente e despedir-se dos colegas e, para os mais favorecidos, dos amigos.

Trânsito – carro – ônibus. Enfim, depois de 1 ou 2 horas chega-se ao tão esperado lar.

Banho, ou às vezes, nem isso. O cansaço é tanto! Jantar talvez, ou até uma jantinha boa.

A cama parece ter vida própria, e te chama pelo nome. Chega o esperado momento: deitar-se, desmaiar, a canseira te consumiu.

Olhando para esta rotina, vivemos em liberdade? Liberdade de quem? Prisão a favor do que?

O dinheiro, o capital é tão necessário, acha-se favorável manter um emprego porque a crise está feia.

Na verdade, o ser humano moderno vive num regime semiaberto há muito tempo.

Agora, então, aprisionados nos celulares ultra mega super potentes, a situação piorou muito. Troca-se até uma boa conversa com os filhos por horas num aparelho sem vida, mas capaz de consumir os sentimentos das novas criaturas.

Saudade do tempo das conversas à luz da Lua com toda parentada reunida, em algumas famílias, havia até um violeiro.

Acordava-se bem cedinho, com o cantar dos galos, com aquele delicioso café da manhã quentinho e leite tirado na hora, cuidava-se do próprio sustento sem química nenhuma, lavava-se a roupa sem poluir nossos rios.

Parada para o almoço, o relógio? Ah! Esse era o Sol onde todos sabiam as horas sem ponteiros.

Conversa à mesa com todos reunidos...quem sabe até uma cochilada. Hábito mantido em algumas localidades atualmente.

Volta ao trabalho, mais um pouquinho, o retorno para casa não tarda, pois não pode anoitecer.

Ao anoitecer estão todos em casa, de banho tomado e a prosa toma conta do ambiente à luz do lampião e da Lua soberana.

Em épocas de frio, a fogueira era frequente. E o milho na brasa exalava aquele cheiro de festa no campo.

Hora de dormir. Descanso ao som das cigarras e grilos. Dormia-se de 8 a 10 horas.

Será que vivia-se em liberdade? TOTAL!

Nenhum número de ponteiro amordaçava a humanidade. Nenhum aglomerado infindável de pessoas fazia-nos ficar parados num lugar por horas e horas.

Vivemos em regime semiaberto na Pós Modernidade. O preso sai pela manhã e volta à noite para cela, comprovando para a Justiça, o ganho do capital.

Este preso cometeu algum delito e já recebeu o benefício de sobreviver em regime semiaberto.

Ele ganhou uma progressão de pena e nós? Qual será nosso delito? Quando acontecerá nossa progressão de pena?

A vida moderna nos levou à prisão em busca do capital, este governa interinamente nosso tempo. Quanto mais tempo eu trabalho, mais din din eu ganho.

Ah! Ledo engano!

Gasto com remédio ansiolíticos, calmantes, medicamentos para dores em geral, me autoflagelo, perdendo minha saúde física e mental.

Os números não mentem quando mostram o alto índice de afastamentos médicos do trabalho por depressão. Reflexo de nossa prisão interna.

E muitas vezes vem a ideia: ”Queria largar tudo e sumir!”

Sumir pra onde? Inconscientemente, para aquele tempo em que os ponteiros e as notas de cem não me comandavam. O tempo em que o consumo não era desenfreado e o aquecimento global ainda não era um problema.

Ah! Que saudade!

Estelinha Cardoso
Enviado por Estelinha Cardoso em 09/09/2018
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