Partes de mim

Nem pensei muito, acho até que se tivesse feito choraria ainda mais. Apenas sentada no banco do carro, olhei pro céu e vi lindamente um arco-íris se formar. Curioso porque não estava num momento muito bom, na verdade, péssimo. E consegui achar beleza em algum lugar, mesmo que distante.

Ali, sentada, só sabia chorar. Como disse, nem pensava muito sobre o motivo, quaisquer soluções possíveis, só chorava. Era como se eu tivesse que tirar do peito uma angústia sem explicação; pelo menos não pensei em nenhuma em que eu quisesse realmente acreditar. As lágrimas me limpavam a cabeça na mesma proporção em que me inundavam o coração de perguntas sem respostas. Só não sabia se era eu quem estava fazendo os questionamentos errados ou se os retornos eram tão sutis que minha alma ingrata não captava em sua totalidade.

Enfim, ver aquele colorido me fez tomar um respiro mais longo e profundo. Por instantes as lágrimas insistentes cessaram e minha mente limpou-se para surgimento de novas e mais crentes reflexões. Será que encaro como uma mensagem, será que tenho que notar mais os pontos positivos do que os negativos ou foi só a luz do sol refletida pelas gotas de chuva fina começava a cair já no início do dia? Incrédula. Descrente... Permito-me ainda assim.

São acontecimentos como estes que nos fazem parar de sofrer por pequenos detalhes realmente sem importância e enxergar que há mais a agradecer mesmo. Clichê essa coisa toda de ‘gratidão’ mas, ser grato para consigo, inclusive, é um presente, uma bênção que poucos sabem receber. A gratidão é mais por nos permitirmos viver, conviver e aprender com tudo.

Fácil falar não? Não! As lágrimas escorrem e eu tento me convencer disso tudo. Tento me fazer enxergar que há de se tomar cuidado sim, e isso nos faz encarar a realidade feia das pessoas. Há mais mentiras cativantes por aí do que verdades gratas. E isso nos dá cada tombo! Foi numa dessas que eu caí, conto do vigário, sabe? A confiança em mim mesma foi ludibriada por falsas considerações. Quando sentimos algo a tendência é saber se é verdade, até como autoproteção. E me passou batido isso. Me abri e não soube catar os pedaços que se espalharam pelas incertezas escancarada, mas ocultas pelos meus olhos cansados.

Então, volto ao meu pranto no banco do carro, em frete ao arco-íris matinal. Há de ser algo maior do que eu consiga enxergar, preciso me agarrar a esta esperança, caso contrário, por que exatamente fiz o caminho de volta pra casa então? Nesta hora lembro que deixei o café passado, o livro marcado na melhor página de Clarice, bem em cima do banco do jardim da minha própria casa, onde as flores estavam lá apenas para me lembrar que há mais colorido no mundo do que eu ando conseguindo apreciar... Sem mencionar o abraço aconchegante, prometido por alguém que me ajudou a recolher as partes de mim que nunca nem eu soube onde deixei...

Sheila Liz
Enviado por Sheila Liz em 18/09/2018
Código do texto: T6452363
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