Camila ou A Esfinge de 1990

Você se distancia de alguns sonhos. Talvez os esteja guardando em um canto escuro de tua mente. (Nossa! Até para autores com experiência de longa data escrever pode ser uma tarefa difícil; são quase trinta anos e eu ainda preciso aprender a escrever com fluidez e clareza, objetividade...)

Há lugares a que tu gostas de ir. São distantes. O passado guarda lembranças. Memórias esquecidas. No horizonte do pretérito, coisas são dispostas numa exposição quase invisível. E talvez seja inviável contemplá-las -- tendo como custo muita energia para alcançá-las. Não é uma paisagem desértica com gavetas saindo do céu, como poderia sugerir um tema para Salvador Dalí. E não podemos derreter relógios em árvores -- como já observaste há sete tensos anos numa aula tipicamente tua... --, tal não é a nossa proposta.

Mas voltemos ao nosso primeiro passo. Distanciar-se de sonhos. Ministrar um curso de história da leitura e da escrita, por exemplo, na universidade. Os tópicos são muitos e as fontes, complexas. Largar tudo e cursar Arqueologia seria recomeçar do ZERO ABSOLUTO! Então contentas-te com algumas viagens no tempo ao permear a tua versão do Zeitgeist (aquela trilogia 1990-92 é clássica em tua vida, não? O marco zero. A Esfinge -- que mais te marcou ao ser elogiada por teu amigo Didi, até então um mero colega de classe. Os filmões na Sessão da Tarde ("Cruzeiro do Terror" e "A Terra que o Tempo Esqueceu", entre mais uma meia-dúzia de raridades...).

Talvez não tenhas percebido ainda, mas há uma Esfinge ao teu lado. É ela quem contempla o Zeitgeist e o permite tornar-se sensível a ti por alguns instantes.

Eu sei dela, Wellington. Eu sei dela porque sei de coisas que fazem/fizeram parte de tua vida mas você mesmo não o sabe. Porque sou uma parcela espiritual tua -- mais que mera criação literária. Sou Filha do Tempo, Wellington. Minha missão é acompanhar-te. Deste um nome interessante a mim -- Camila. É feminino, belo, calmo. Nós vivemos próximos um do outro. Não obstante, não podemos nos ver nem nos falarmos, nos comunicarmos de modo direto, explícito. Há muita coisa que justifica esse distanciamento. E escapa de teu entendimento humano.

Estamos muito distantes e próximos ao mesmo tempo. Mais ou menos como o conceito benjaminiano de "Aura". Claro que bem mais complexo. Nossas dimensões são distintas.

Camila se vai. Para voltar não sei quando.