Numa certa esquina...

Ela começou dizendo assim: - Se eu soubesse essa chaga não me arderia no peito, jamais teria chegado perto de ti. Ah, se eu soubesse que esses teus beijos se tornariam uma prisão sem grades, não teria te olhado. Se eu soubesse o que viria ao te olhar naquela esquina, não conversaria contigo e nem te deixaria me seduzir com as tuas palavras instáveis e persuasivas. Se eu soubesse o submundo de solidão que viria contigo, nunca tu terias acesso a mim, a morena não te pertenceria jamais. Eu teria dobrado aquela esquina e olhado para qualquer um menos para ti. Mas teus olhos me seduziram como a vaga do mar da Capitu. Se eu soubesse. Porém, não sabemos. Assim, tento aceitar o desengano, dar as mãos para ela e usá-la como forma de inspiração. Superar a agonia com resiliência como a ficção nos diz. A única coisa que ainda consigo é fugir. Se eu soubesse, não diria que não quero o mundo real, que quero viver entorpecida para não sentir, para não pensar, pois eu não saberia de todas as inverdades toscas que viriam. Se soubesse a parte de mim que te amava nunca teria nascido, pois hoje a parte de mim que te amava está vazia. Se eu soubesse, não te escreveria essas frases, como a parte de mim que te amava tomou todas minhas outras partes. Dizia ela, olhando-me com um olhar tresloucado para o corpo ensaguentado a sua frente.

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 14/11/2018
Reeditado em 04/12/2021
Código do texto: T6502623
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