Affair

Ela pediu 15 minutos a mais a ele. Após um longo e caloroso abraço; após sentir que ele estava prestes a fazer qualquer loucura ali mesmo, em meio a todos os convidados, ela pediu 15 minutos até que ele fosse encontrá-la no quarto. Era um simples pedido, apenas impedia que a decisão que haviam tomado ali, num momento tão inapropriado, fosse compartilhado com pessoas tão próximas e proprietárias de um julgamento assertivo e cruel.

Olhando-a subindo as escadas, o som estava alto, quase não ouvia seus próprios pensamentos, observou seu caminhar lento e só imaginou o que estava por vir. Ficou ali esperando realmente os minutos pedidos. Olhou o relógio, ansioso, ao redor sentia apenas a luxúria que o levou a abandonar tudo o que já tinha conquistado arduamente. Se deixou levar por um instante e ele permaneceu como uma onda, invadindo o ser de uma maneira inevitável.

Os olhos se marejados pela lembrança do que um dia teve, o fez limpar o rosto com as lágrimas... mais de desespero do que arrependimento em si. Gostava de estar ali, apreciava o momento que estava vivendo, mas, e o que poderia ter conquistado ainda mais? Até onde teria ido se tivesse permanecido no caminho que estava a trilhar? Este deslize o levou a um torpor sem igual, mas ele sabia que tinha data de validade.

Os 15 minutos estavam longe de terminar, e ele mal notou que não se passara nem um minuto ainda. Tentava entender como tudo se encaixava. Na verdade, nada mais tinha lugar, nem sentido, nem emoção, a não ser a saia por subir nas pernas dela... aí sim via o motivo pelo qual abandonara os almoços familiares dominicais. Chatos, sem grandes emoções a não ser a cobrança sobre o lançamento de seu próximo artigo. Mal sabiam que sua inspiração estava longe dali e tinha um cheiro doce no cabelo.

A curva que a boca dela fazia ao sorrir não tinha a mínima lógica. Se perdia nas covinhas que ela apresentava ao dar um sorriso largo e proposital, afinal, sabia deste encanto, e o usou justamente para deixá-lo por perto. Não era uma má pessoa, mas carregava um ‘ar sombrio’, e isso, inexplicavelmente também foi um dos motivos pelo qual ele enlouqueceu por ela. Era como se ela estivesse ‘quebrada’ e ele estava ali para consertá-la. O tédio que ele reconhecia nela fazia parte da realidade dele, resolveu simplesmente dividi-lo.

A intensão dela era outra. A cama lhe servia melhor que um café da manhã bem preparado. Os lençóis molhados de suor lhe davam um prazer objetivo que ela jamais trocaria pela companhia monótona de um almoço no meio da semana. Mas ele não percebia nada disso. Os olhos verdes cheios de carência o iludiam.

E assim os 15 minutos estavam chegando ao fim. Ele parado ao pé da escada, disposto a subir sem olhar pra trás, sem ter consciência pesada, sem pudor e nem culpa. Ainda assim algumas poucas lágrimas teimavam em lhe molhar o rosto e isso o fez parar por um instante. Olhou ao relógio novamente. O tempo é relativo, neste momento foi relativo. O que faria ele com este vício que o consumia a cada passar de segundo? As marcas que ela deixava a cada noite eram maiores do que as que se via em seu corpo e ele não lidava bem com abstinência, de nada, e nem queria deixar de possuí-la mesmo que fosse a vontade dela de não deixar mais o toque contínuo.

Escutou ao fundo, além da música alta, a voz dela. Reconhecia o tom e sabia o que estava acontecendo. Ele perdeu a hora, passaram-se os minutos e ele só subiu o primeiro degrau. Ela o esperou no topo, ele sem coragem por ali ficou. O som que ele escutava era ela encontrando carinhos alheios. Insuficiente. Ele perdeu o atalho que havia escolhido e já não tinha mais o caminho de volta. Olhou novamente no relógio e os ponteiros não marcavam mais nada. O cheiro doce que uma vez o seduziu, despertou um enjoo imediato. Já não fazia sentido mais. Outra pessoa a tocara! A impureza e a imoralidade do que eles escolheram para viver tinham que ser somente deles. Ela o traiu em sua própria decisão. Sem aguentar o peso do que tinha escolhido para a vida dos seus, saiu daquele caos sem rumo. Abriu a porta, sem fechá-la, e não olhou pra trás. Só caminhou pela noite, deixou o relógio ao pé da escada. Apenas dois minutos contavam no tempo passado...

Sheila Liz
Enviado por Sheila Liz em 29/11/2018
Código do texto: T6515258
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