O amor em meio ao cansaço

Passava do meio dia, e o calor estava insuportável, o ônibus lotado, no meu percurso de todos os dias, do trabalho para casa. Logo que passei pela catraca, vi na cadeira que fica perto do cobrador, uma jovem mãe com uma criança de aproximadamente seis meses em seu colo, os olhos fechados denunciava o sono e o cansaço incontroláveis, não somente dela, mas também da criança que se acomodava em seu colo que dormia quietinha, de vez em quando escorregava, mas logo era ajeitada por ela. Ao seu lado, na outra cadeira, seu outro filho, de mais ou menos dez ou onze anos, também dormia, e com o pescoço pendurado para traz, só acordava quando o ônibus freava bruscamente, o seu irmãozinho de mais ou menos 3 anos que também dormia em seu colo, escorregava, e a mãe o ajudava, pegando em um dos seus braços e o colocava em uma posição melhor no colo de seu irmão.

Pelo que eu observava, a jovem mãe carregava um cansaço que se estendia aos seus pequenos filhos. Uma curiosidade me invadia, e me paralisava, não conseguia ir adiante para também me acomodar no corredor daquele ônibus. Em alguns instantes, tive a impressão que ela olhava para mim, por alguns instantes, me senti também responsável por eles. Firmei-me então, ao lado de sua cadeira, para que ela pudesse dormir naquele trajeto, observando nas curvas, os desconfortos que fazia as criancinhas escorregarem dos seus colos, quando me vi, eu também estava puxando um e outro para acomodar nos seus colos. Eu nem entendia direito o que eles estavam passando, mas sabia que de alguma forma, eles vinham de uma luta, de uma noite mal dormida, de algum abandono, pois o cansaço e o sono não os deixavam em paz.

Aos pouquinhos, se aproximava a minha parada, eu teria que descer, eu queria falar com ela, mas não conseguia, de certa maneira, eu estava admirando aquela cena, ainda não tinha visto algo igual. Em minhas íntimas preces, pedi por eles, mas não falei com eles. Coloquei minha mão no bolso, e escondido peguei uma nota de vinte reais, me abaixei até seu ouvido e disse: "compre alguma coisinha para o seu bebê". Saí apressada com medo de que ela achasse ruim, e entre as pessoas fui me escondendo até chegar à porta por onde eu já ia descer. Seus olhos me acompanhavam, e num cantinho da boca, vi um tímido e leve sorriso que me deixou aliviada. De lá, a vi cutucando seu filho mais velho, mostrando aquela nota, o filho sorriu e voltou a dormir. Essa imagem me acompanha todos os dias, não sei o que eles passavam, mas aprendi naquela tarde que o amor por vezes, é silencioso e cuidadoso, em meio ao cansaço e o desamparo, ele sobrevive ainda cuida.

Maria Jucilene de Moraes
Enviado por Maria Jucilene de Moraes em 06/01/2019
Reeditado em 06/01/2019
Código do texto: T6544432
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