Limites

Um dia sonhei que voava, e não era tão bacana quanto imaginara. Pensava que sentir o vento no rosto, ter agilidade por andar entre as nuvens e ainda vê todo mundo de tamanho bem reduzido seria a melhor sensação que jamais poderia sentir na vida. Bobagem. Não que ter a liberdade em nossas mãos pareça terrivelmente terrível, só que o medo de ser dependente dela e então deixar de ser livre é a constante que me mantinha confuso. Tirei muitas conclusões desse sonho bizarro e uma delas me diz que apesar de sempre querermos e buscarmos por uma determinada liberdade, sempre devemos sentir na mesma medida a necessidade de impormos limites a tudo.

Limites podem parecer, a grosso modo, barreiras que precisam ser quebradas para atingirmos pontos verdadeiramente longínquos, que por sua vez trarão mais e mais liberdade. E de fato não o deixam de ser, porém o que fica escondido por de trás dessa faceta é que a liberdade em excesso acarreta muitos efeitos colaterais. Grande parte de nós não sabe como lidar com ela e depois de muito tempo passa a abusar e se torna, mesmo que involuntariamente, dependente dela.

Matematicamente falando, o conceito de limite é usado para descrever o comportamento de uma função à medida que o seu argumento se aproxima de determinado valor. Observamos que inclusive no mundo de números ele serve também de parâmetro para a observação do comportamento de uma função. Só com uma pequena diferença: aqui, em alguns casos, esse limite tenderá ao infinito, coisa que na prática não pode ser feita.

Somos seres falhos, nossas limitações, embora as mais escondidas, são inerentes. Nunca somos o que queremos, não fazemos tudo o que sonhamos, não temos o dom de estarmos onde desejamos, não possuímos tudo aquilo que queríamos. E dentro deste mundo cheio de limitações é que nos movemos e interagimos. E não pense que todos os limites são os mesmos para cada um. Assim como não somos figurinhas repetidas, não teremos as mesmas limitações. Conhecer ambos os limites, pessoais e os dos outros, é uma tarefa para toda a vida, aliás imagino que sejam necessárias várias vidas para fazê-lo. Mas não é só importante conhecê-los, tão importante quanto tal é respeitá-los. É com esse respeito mútuo que teremos relacionamentos mais fortes, e aquelas falhas, apesar de evidentes, serão meros pormenores.

Talvez um dia consigamos descrever algo e tê-lo sem limites. Até “mesmo no amor tinha-se que ter bom senso e senso de medida” . Só mesmo em sonhos nossas limitações mais extremas podem ser quebradas, e no meu caso quando aconteceu, não foi tão realmente bom quanto imaginara, até lá me forço a ter limites.

“ ” -- Clarice Lispector – O livro dos prazeres