Feitos Poeira.
O problema maior é que nós nos divertimos nas tragédias, nas trincheiras. Na verdade até gostamos delas. São más e ácidas, mas nos mostram que somos até mais resistentes do que pensávamos. Mais resistentes do que a própria morte. Com o esquentar do sangue, nos sentimos mais vivos e reforçados. E no final ainda rímos de tudo isso por saber que nada vai mais além que ela, a cavernosa. E contra essa igualmente lutaremos com faca entre os dentes, até o sangue, até o estertor.
Lembra que dias assim são os marcos de nossas vidas fodidas, e enquanto se puder prosseguir, vá! Vá de qualquer jeito!
Lembra a primeira vez que se viu num tribunal diante aqueles malditos velhos decrépitos vestindo suas togas pretas fedorentas (na verdade nunca se aproximou deles), te olhando e fazendo perguntas sarcásticas e cheias de pegadinhas? Tipo testando o neófito ali diante seus deveres cívicos? Uns até riam.Você, suarento e palpitante, respondeu a todos e saiu vivo de lá. Isso é coisa pouca! Uma besteira. Uma babaquice.
Lembra?
E quando foi parar no leito de morte com uma meningite meningococica, onde até padre chamaram? Lembra-se nitidamente do balançar da cabeça do médico quando uma tia perguntou qual seu estado clínico. Ele só olhou para ela, balançou a cabeça com a boca cerrada e olhando para os lados, e respondeu assim, na lata: "ou morre ou fica sequelado!" Ali tu viste a morte! Jurou de si para si! Tinha vinte e três anos.
Viu Raul Seixas subindo pela janela com um violão nas costas, sentar na cadeira ao lado de sua cama e tocar olha o trem. Viu insetos gigantes também, advindos da mesma janela do nono andar.
Então, meu amigo, deixe-se ir e vá procurar um psiquiatra, uma igreja, uma psicóloga gostosa ou um bar...
Savok Onaitsirk - https://www.recantodasletras.com.br/cronicas/6579137