Para o pequeno Arthur.

Oi, garoto, eu não te conheci. Mas tenho certeza de que já te vi. Vi você no meu filho , quando guri. Risonho, lindo, cabelinho de anjo, sem nenhuma malícia, puro.

E como eu gostava de brincar com o meu Vinícius, nome do poeta do amor demais!

Lia estórias do pateta prá ele, dos ursinhos, assistia Dumbo. Na praia, numa tarde, ele deitado nas minhas costas e eu dizia: faz de conta que mamãe é um tubarão e você, um caçãozinho.

Em tardes de chuva, gostávamos de nos deitar no chão do quintal da casa da avó. Era o nosso campeonato: qual dos nossos umbigos se encheria mais rápido de água. E achávamos graça nisso.

E tinha pipoca, brigadeiro, sorvete, jogo do Palmeiras... e muitas conversas produtivas também. Eu fui te ensinando muitas coisas, filho, da vida. O pouco que sabia, é claro. Mas eu fui te ensinando que a vida é boa se a gente for bom e que temos que estar atentos às necessidades dos outros. Mas sempre atentos e com coração disposto. Exercitar a empatia e eu fui te mostrando o real significado dessa palavra que, aliás, aprendi muito bem com a minha avó Noêmia. Ela me ensinou a repartir a comida com generosidade e presença.

E assim eu fui ajudando a construir a história do meu Vinícius, que hoje é homem, mas homem mesmo, que não brincou de arminha, não desdenha da dor alheia e soube ter compaixão.

Arthur, você, tão menino, resolveu ir embora. Acho que você entendeu que esse mundo não está bom e resolveu ficar na maciez do seu entendimento das coisas. Não te tiro a razão.

Você optou por não conhecer o que é falta de caráter, a maldade contida em olhares vis e corações podres que grassam por esse país afora.

Mas eu quero te falar uma coisa, garoto. Ouça bem. Abra bem os ouvidos: tenho certeza de que você tem uma família que vale mais que todo ouro. A começar pela sua bisavó, que não conheceu, a dona Lindu. Eu também não a conheci, mas sei que ela ensinou muito bem os seus filhos. Um filho dela é o seu avô Lula.

Há anos, bem antes de você nascer, eu já dizia que o seu vovô era o homem mais importante desse país. Ou melhor, eu digo que ele é o homem mais importante desse país em todo o século XX , que você também nem tinha nascido. Ele fez com que pessoas famintas tivessem comida, que pessoas pudessem ir à escola e escolher um futuro. Ele fez muito mais que isso. O seu vovô é um gigante, Arthur, um verdadeiro gigante e com uma história de vida magnífica, de superação, respeito e muita, muita perseverança. Por isso querem derrubar o meu eterno presidente. Existe uma coisa que você não sabe, nem ouviu falar: inveja. Uma inveja doída, doentia, incapacitante, que transforma o coração num pedaço de carne podre, fedida. A alma dessas pessoas fede... e você não entendeu isso. Por isso você visitou o seu vovô numa cela em Curitiba. Porque existem muitas pessoas de alma fedorenta, que tentam disfarçar com suas roupas de grife e sapatos de couro. Usam perfumes franceses para espantar o fedor de suas almas doentias. É isso.

Mas ,por favor, Arthurzinho, de onde você estiver, mande notícias para o papai, a mamãe, o vovô e diga que você está bem. E mais: brincando com a vovó Mariza. Peça para ela fazer pipoca, brigadeiro, assistam o jogo do Corinthians e, não se esqueça, se deite com ela na chuva e façam o campeonato: vejam qual umbigo vai se encher primeiro de água.

Faça isso, Arthurzinho, e seja muito, muito feliz.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 03/03/2019
Reeditado em 22/03/2019
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