ODEIO GENTE SENSATA!

- Mas esse sujeito que está escrevendo é um pé no saco, hein?

- Odeio gente sensata!

Valho-me da mídia social (facebook) para interagir com escritores, amigos, e postar textos de minha autoria, como crônicas, contos ou novelas.

Eventualmente, participo de comentários sobre alguma postagem, mas, ultimamente, tenho evitado fazê-lo, porque, quase sempre, o que escrevo é mal recebido. Devo esclarecer que costumo utilizar linguajar objetivo, moderado, respeitoso, e mesmo que em desacordo com o que foi postado, peço licença para discordar, fundamento minha ótica e evito confrontação.

Como já disse antes, em alguns textos, sou um observador neutro, e jamais me alinho com trilhas ideológicas, agrupamentos políticos ou movimentos sociais, preferindo apoiar e dar meu aval a projetos ou obras que, efetivamente, façam alguma diferença, venham as iniciativas de onde vierem. Não perco tempo em discussões estéreis sobre assuntos polêmicos, porque não há como encontrar um senso comum, quando a maioria privilegia a discussão.

Acredito que, aos poucos, ao longo de décadas (muitas, talvez) consigamos alcançar um nível de entendimento razoável, que permita vivermos em paz relativa, mas para isso ainda será preciso deixarmos de lado “nossos” interesses, para buscar o interesse “comum”, despido de partidarismo, de ideologias, de cartilhas doutrinárias, de estratégias, populismo, idolatria e vários outros obstáculos ao pleno livre arbítrio.

Sempre que abordo esse assunto, alguém avança para me calar, anunciando que estou fora da realidade, que isso é utópico, que é preciso tomar medidas imediatas e drásticas, mas, se os pioneiros, cientistas, inventores, filósofos e outros pensadores, não projetassem a utopia em suas mentes, ainda estaríamos na idade da pedra. Cada avanço que tivemos, foi alcançado por sonhadores, utopistas, idealistas, que não se conformavam com o cotidiano existente.

Nosso presente é uma época confusa, onde se alternam riqueza e pobreza, tecnologia e primitivismo, conhecimento e ignorância, e onde o juízo de valores está tão deformado, que não há como estabelecer um padrão confiável sobre o que é certo ou errado, sobre o que está melhorando ou piorando. A maioria dos humanos vive sob regimes ditatoriais, principalmente, no oriente e locais próximos. Muitos povos africanos, além de sofrerem com ditaduras, ainda têm de usar muitos subterfúgios para escapar de intensa e contumaz violência. Nas Américas, o poder transita entre esquerda e direita, mas até hoje nenhuma mudança significativa e efetiva pôde ser transformada em realidade indiscutível e prosperidade estável para os habitantes.

A única coisa comum e constante é a agressão e chacota que uns e outros se permitem utilizar, para incomodar oponentes. E ainda querem cooptar todos em volta, para que escolham de que lado se posicionarão. É claro que a razão fica muito comprometida nesses embates, em que imperam os pontos de vista, o histrionismo ideológico, a “verdade irrefutável” de cada um ou de cada grupo, as dissertações de experts e figuras proeminentes, além do personalismo.

Recentemente, por ocasião de um acontecimento triste, li uma postagem, em que amiga virtual lamentava o jeito de ser de algumas pessoas, que, segundo ela, apresentavam um perfil negativo (não lembro das exatas palavras). Comentei que não era adequado generalizar, pois os humanos diferem muito entre si, e tomá-los grupalmente pode gerar distorções várias em nosso modo de ver, pensar e agir. Ela respondeu, educadamente, que eu não entendera sua declaração, que , diferentemente do que li, direcionava-se, unicamente, a uma pessoa.

Ato contínuo, outra pessoa postou um comentário sequente, dizendo o que escrevi no início deste texto, nas duas primeiras linhas. Repito o final: “Odeio gente sensata!”

Toda a pobreza, miséria, doença e mais uma série de bizarrices, mundo afora, afrontam o princípio ético que deveria nortear nossas atitudes, mas acho pior ainda verificar que antes de podermos enfrentar o mal físico, social, ambiental, teremos de erradicar o mal que infesta nosso íntimo, porque, como disse essa pessoa, amamos odiar, odiamos a sensatez, tendemos a glorificar o prazer, os arroubos, a ambição, a disputa, o interesse, a divisão, e sempre vamos em busca de nos sentirmos especiais, de defendermos a única verdade, o único caminho, de sermos lúcidos num mundo de alienados,ou querermos que o mundo se dane e não incomode.

Não tenho conhecimento suficiente, ou moral; nem sou virtuoso, desapegado, e por esse motivo despreparado para apontar erros ou acertos. Apenas lamento nosso caos mental.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 04/03/2019
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