Trabalho com Educação desde os anos 80. Com a discussão surgida pelo massacre em Suzano, de repente cá estou eu a pensar: será que eu conseguiria empunhar uma arma dentro do meu local de trabalho para enfrentar um louco assassino, ou quem quer que me exigisse essa atitude? Minha resposta é não. Sem dificuldade alguma pra responder. Não consigo me imaginar segurando um 38 (por enquanto, pois talvez o mundo exija em breve algo mais potente e sofisticado) a disparar tiros contra qualquer pessoa.

Digo também que é estranho estar viva para assistir a essa discussão. Nunca pensei que um dia, aquela professorimha que se formou em 80 e abraçou o magistério por amor teria que ouvir que além de saber manejar o giz (cuja tendência é desaparecer também) teria ainda que pensar em aprender a manejar revólveres. A escola, para mim, sempre representou lugar de paz, de diálogo, de busca de soluções: a pedagogia inevitavelmente é um braço importante da Psicologia, da Psicopedagogia, da Terapia Ocupacional, da Enfermagem, da Advocacia, da Assistência Social e por aí vai, já que o Professor em sua prática faz de tudo um pouco por não ter ajuda quase nenhuma de serviços especializados. Irônica e supostamente, em breve ele terá também que ser um “matador”, para proteger-se e livrar seus alunos de perigos iminentes.

Como dizem no popular “tô lascada!”. Eu não sei atirar nada. Nem uma simples pedra. Nasci, eu acho, com deficiência para “atiramentos”. De atirar mesmo, só um beijinho para os pequenos na ponta dos dedos quando deles me despeço, ou os vejo de longe na rua. Sim, “Tô lascada!” se tiver que empunhar um 38 ou qualquer coisa que o valha para me defender ou em defesa de gente em situação de ataque. E é bom que se diga: não me sinto em dívida com o mundo por causa disso. Não nasci pra matar. Há pessoas que nascem e parecem fazer isso com muito gosto e naturalidade. Treinam tiro, aperfeiçoam alvos, fazem estragos espetaculares com uma arma na mão.

Assim como tem gente que gosta de arma, eu gosto de outras coisas. Livros, por exemplo, me encantam, aqui em casa tem boas dezenas deles. De qualquer gaveta ou portinha que se abra por aqui, brota um livro. Também gosto muito do giz, do lápis, das teclas do computador que me ajudam a escrever versos e palavras amorosas para o mundo, para as pessoas, para os corações desalentados. Eu me dou melhor com a beleza, bem melhor. E quem se dá bem com a beleza não consegue combinar com estampidos, sangue derramado, ódio, dor e morte fora de hora.

Pois é, sou uma professora antiquada, que não se adapta ao tempo das armas, que jamais será uma exímia atiradora, formada num clube de tiro. Tô lascada, tô perdida nesse mundo sanguinolento que me cerca cada vez mais. E quase acuada, pois que o cerco mais se fecha e não acho mais lugar para me mover de forma confortável. Vou fazer o quê? O mundo, e dentro dele o Brasil, está cada vez mais atuante em novas ideias sanguinárias. Eu? Pobre de mim! Não tenho coragem de matar uma barata com uma havaiana, só pra não ter que ouvir aquele barulhinho ruim que ela faz ao ser esmagada. Imagine-me no comando de um 38 disparando tiros à queima-roupa! E é à queima-roupa mesmo, pois em muitos casos nem dá pra dizer “Mãos ao alto, ou eu te mato”. Nunca que chego lá! Sou e serei sempre pelo “Mãos ao alto, isto é um abraço”. Palavra de professora!