Eu também sou tempestade

Desde de criança amo tempestades. Uma paixão tão intensa como as chuvas com raios e rajadas de vento. Lembro que sempre que vinha uma tempestade, corria para uma pedra que ficava próxima ao pasto aberto, no sítio onde fui criada pelo meu avô e minha avó. Lá dava para ver a chuva vindo de longe, branca, forte e furiosa.

E eu sentia euforia a cada momento de proximidade. Sentia cada gota de chuva espaçada no rosto como um beijo de boas-vindas. E ali, frente a frente com a tempestade, eu não sentia medo algum. Ao contrário, sentia poder, liberdade e força. Como se eu fosse parte da tormenta. Cada raio brilhava em meus olhos.

Hoje, alguns bons anos mais tarde, ainda amo tempestade e não tenho medo delas. Claro que assistir uma tempestade no campo é uma coisa, na cidade grande corre o risco do seu carro ser carregado pelas enchentes causadas pelas imundices do próprio ser humano.

Mas retomando o assunto, ontem estava na roça como é de costume dos meus finais de semanas e quando a noite veio começou a formar uma tempestade das grandes, com nuvens carregadas e aquele vento característico. E em um dado momento fui para janela, para observar a chuva que se aproximava e ainda que no escuro da noite era possível ver a silhueta das árvores dançando na escuridão. Cada relâmpago era um lampejo de memória e cada lembra aquecia meu coração e trazia paz. Uma paz tão profunda que não sentia havia anos. E não era paz porque fez com que eu esquecesse dos problemas, mas porque me fez lembrar que estou viva, que tenho força para lutar, que não importa quantos sonhos me roubem sempre irei sonhar novos e melhores. Que não preciso ter medo das tormentas, pois elas sempre passarão e no final a alma estará arejada.

Olhando para dentro da noite, como o coração em paz e mente quieta, eu me reencontrei e lembrei, como cheguei até aqui. Foi esses sentimentos tempestivos, ainda que dormente em minha alma que me ajuda todos os dias a erguer a cabeça e olhar para cima e quando fazemos isso a caminhada não perde o sentido ainda que pesada.

E para completar minha noite me lembrei dos versos de magnífica Clarice Lispector, que citarei agora: “Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite.” – A hora da Estrela.

Érica Rosa
Enviado por Érica Rosa em 22/03/2019
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