BAILINHO

Anos 70. Tempo passado. Pitada de adolescência.

Lá ia eu ao famoso bailinho do Clube Centrão.

Música lenta, agitada, garotas no salão. Hormônios pelo ladrão.

Cigarro 100 milímetros, fumaça e charme.

O nome do cigarro era… Charme.

Cara de mau.

Calça boca de sino xadrez. Salto carrapeta.

Camisa Ducal. Perfume Lancaster.

Cabelão. (É, eu ainda ostentava.) Somando tudo, moral na lua.

Sentia-me o Wanderley Cardoso, cantor do quadro

“Os galãs cantam e dançam aos domingos”, no Silvio Santos.

Tinha que dançar igual o cara, pra conquistar a garota.

Calça apertada, agito na cintura. Como na TV.

Igual ao galã. Meio Élvis. Baile apenas começando.

Eu só, só que motivado.

Muitas más intenções. Digo, boas… muito boas.

Queria dançar agarradinho, na lenta.

A rápida mal começava. Comichão.

Vigiava todas as mesas do salão. Olhar de marinheiro.

Jeito de lobo babão, de olho nas “cocotinhas”. 100 milímetros aceso.

Fumávamos em ambiente fechado, sem problemas.

Numa mesa, uma loira. Sozinha e prontinha pra eu chegar.

— Oi, tudo bem? Vamos dançar?

Ela olhava, eu olhava. Trovões dentro do peito, música na pista.

— Não! — Dito sem piedade, pra derrubar.

Curto e grosso. Minha moral? Pro saco.

Cigarro pro cinzeiro. Mas sabia que a caça estava apenas começando.

Mais ao fundo do salão, outra garota, melhor que a primeira.

— Tudo bem? Vamos dançar?

(T-trêmulo…) Topou. Fomos pro escurinho da pista.

Dançamos a rápida…

Veio a lenta dos Beatles… mela-cueca (gíria da época).

Coisa boa! Rosto colado, cintura, sinergia. Um beijo… daqueles.

Beijo de novela. De língua. Calafrio.

Passou um tempão, num segundo. Eternidade.

Era linda, era demais. Queria mais. Bem mais.

Eu, quente e gelado. Anestesiado.

Fim de baile. Peguei minha Bic e anotei seu endereço.

Hora de voltar para casa. Mundo real.

Ônibus lotado, Lancaster vencido.

Fim de Charme. 100 milímetros apagado.

Mais de metro na lembrança.