AMIZADE COMPRADA 'Personal Friend"

Leio um artigo, onde o autor comenta sobre uma nova atividade profissional surgida recentemente à qual foi atribuído o pomposo nome de “personal friend” (em inglês para ficar ainda mais pomposo).

É mais um “personal” que chega para engrossar a lista de tantos “personals” que já existem por aí.

Mas o que vem a ser isso e o que faz o nosso (ou nossa) “personal friend”?

Pasmem meus amáveis leitores: trata-se de uma atividade remunerada onde os personagens em questão oferecem seus préstimos “profissionais”, cobrando por hora de todos os incautos, esperançosos e solitários que os procuram.

Seus “serviços” incluem, por exemplo, idas ao cinema, passeios pelo shopping – com direito a emitir opiniões –, acompanhamento a eventos sociais bem como a todos os lugares onde é de bom tom que se compareça acompanhado. Os “serviços” normalmente são prestados em locais públicos, sendo descartada qualquer tipo de proposta sexual. O enfoque principal é sempre estar em companhia da pessoa que os contratam fazendo com que ela se sinta mais presente e envolvida com o mundo que a rodeia.

Neste mundo atual, onde as facilidades de comunicação são cada vez maiores, o que mais se vê hoje em dia são pessoas solitárias e totalmente incapazes de se integrarem à sociedade, favorecendo assim o aparecimento desse tipo de “profissionais”.

Logo que surgiu a Internet, um dos maiores sucessos entre os primeiros usuários foram as salas de bate-papo, os conhecidos “chats”. As vozes da sabedoria saíram logo dizendo que a Internet havia chegado para aproximar mais as pessoas e que as salas de bate-papo eram o maior exemplo disso. Pessoas sozinhas eram capazes de se relacionar com outras pessoas através dessas salas, espantando o fantasma da solidão. Sem entrar no mérito dessa afirmativa, ouso dizer que as salas de bate-papo – com raríssimas exceções – não resolveram o problema de quem quer que seja. No máximo, talvez tenham apenas ofuscado e mascarado um pouco a real situação de cada um e, passado certo tempo, tudo voltava a ser como antes.

Voltando ao tema principal deste texto, o que me deixa curioso é saber que tipo de pessoa seria capaz de procurar esse “personal”. Será que acredita mesmo que o contratado está ali para lhe proporcionar companhia com toda a boa vontade possível? Será que também acredita que o vazio em sua vida deixará de existir em função disso?

O mundo em que hoje vivemos é extremamente competitivo, emocionalmente frio e demasiadamente tecnológico, não havendo espaço para a candura das boas ações, a beleza das amizades verdadeiras e a naturalidade em dar, no mínimo, um sorriso ou uma pequena palavra de conforto a quem necessite.

O excesso de tecnologia prejudica a aproximação dos seres humanos, afastando-os uns dos outros sem dó e nem piedade. Companheiros de trabalho, às vezes ocupando a mesma sala, trocam e-mails ao invés de conversarem olho no olho. Tenho um amigo que me confessou que a maneira mais direta que encontrou para “conversar” com seu filho adolescente foi através do correio eletrônico, e isso dentro da própria casa (sic).

As famílias não se reúnem mais ao redor de uma mesa para usufruir de uma boa refeição e de uma boa conversa. É cada um pra si e estamos conversados.

Certamente, chegar a esse ponto é o resultado de uma série de fatos ocorridos durante a vida, o que aqui não me cabe especular.

Particularmente, sempre acreditei que os amigos verdadeiros surgem naturalmente. Para isso temos que estar abertos para a vida e para quem está ao nosso redor, praticando sempre aquilo que nos engrandece que é a compreensão, a doação, a presença e o caminhar junto de alguém.

Deus do céu, a que ponto chegamos neste Mundo Novo. Ter que pagar para se conseguir uma “amizade”.

É a cruel realidade dos dias de hoje, que a mim causa uma profunda tristeza, principalmente pela melancólica constatação de que atingimos o ponto maior da solidão de cada um. Mas, como sempre acredito no melhor, espero que as gerações que estão chegando enxerguem e avaliem essa triste realidade e façam o melhor investimento que pode haver nesta vida: a prática e o cultivo da amizade real para que depois não tenham que recorrer a essa patética amizade comprada através de um “personal friend”.

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Arnaldo Agria Huss
Enviado por Arnaldo Agria Huss em 24/09/2007
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