Poços dos Desejos

Motivado pela ausência de assunto, escrevo historinhas nem sempre engraçadas. O humor nunca foi o meu forte. Faço uso deste estado de espírito para afastar a apatia literária que me acomete com frequência. Produzo contos, muitos deles baseados em eventos ou curiosidades jocosas.

Algumas histórias que ouvimos nem sempre são mordazes. Para satisfazer a hilariantes pessoas, costumo narrá-las acrescidas de certa irreverência, às vezes, contrariando o leitor mais sisudo.

Recentemente, um fiel leitor, generoso crítico dos meus escritos, confessou-me sua desaprovação pelo desfecho despropositado de certa historieta narrada em recente crônica humorista de minha lavra.

Muitas piadas, inclusive as de salão, apresentam desfechos incongruentes e até reprovável. Aquela, resultou do humor negro que me contagiou naquele instante, ao lembrar de uma lorota indelicada.

Espero ser anistiado pelo crítico observador, a quem submeto este texto à sua abalizada apreciação e censura. O causo ora narrado compõe o elenco de crônicas humorísticas destinadas a novo livro de minha autoria.

Esta paródia registra acontecimento fortuito ocorrido em viagem de férias efetuada por um casal de meia-idade, cujo epílogo será revelado após o leitor inteirar-se do significado da expressão Poços dos Desejos.

Na Antiguidade, as pessoas se abasteciam de água retirada de poços, cavados na terra, com profundidade suficiente à obtenção do precioso líquido. Elas consideravam a água ali armazenada uma bênção dos deuses, os quais deveriam ser retribuídos por sua generosidade. Para tanto, ofertavam-lhes moedas em agradecimento, não reaproveitadas com receio de provocar a ira das divindades.

Fontes famosas existem mundo afora. Na Inglaterra, um poço existente em época remota, na Nortúmbia, era dedicado à Conventina, deusa celta dos poços e nascentes de água.

A crença nos deuses caiu em desuso, mas as pessoas continuam a jogar moedas no fundo dos poços e efetuar pedidos, na expectativa de serem atendidos. A fonte mais famosa do mundo é a Fontana de Trevi, em Roma, na Itália. Lá, o turista atira uma moeda sobre os ombros e faz o pedido que lhe convier. O mais comum é pedir para voltar à Roma.

No filme A Fonte dos Desejos, de 1954, os personagens jogam uma segunda moeda na Fontana de Trevi, pedindo para se apaixonar por uma pessoa de origem italiana. Jogando uma terceira, casaria com a pessoa sonhada.

Existem poços em diversos lugares, alguns intitulados de Poços ou Fontes do Desejo. Muitos autores escreveram sobre eles. Para fins de ilustração, menciono o livro da autora Domingas Alvim, sob o título Poços dos Desejos, expressão usurpada por mim para intitular esta crônica.

Finalmente, contarei a história do casal mencionado no início desta narrativa. Cansados de enérgicas caminhadas, Antônio e Rosa pararam em determinado local onde repousava uma placa com os dizeres: Poço dos Desejos. Disse Rosa a Antônio:

– Jogue uma moeda no fundo do poço e faça um pedido. A graça virá com certeza.

Assim fez o marido. Jogou uma moeda, ocultando da esposa o pedido que fizera. Rosa, imprudentemente, debruçou-se para ver a descida da moedinha ao fundo do reservatório, despencando numa trajetória fatal.

Antônio, imperturbavelmente, disse para si:

– Não é que funciona!