O Homem é o seu Algoz.

"O homem que mais vive, mais sujeito está às inquietações mundanas". Não me recordo de quem é essa frase, a li há muito tempo num livro cujo título e autor agora me fogem da memória. Sei que li em um vagão lotado de metrô, o que parece redundância, numa gélida manhã de inverno paulistano, nariz escorrendo, em pé e esmagado como sardinha enlatada. Era um livro de filosofia, acho que talvez “Filosofia da Vida”, de Will Durant, autor que gostava e gosto muito. Talvez, não me lembro perfeitamente, uma vez que já se passaram mais de vinte anos dessa boa época em que morava na Paulicéia Desvairada e lia em metrôs, ônibus, bancos de praça e onde surgisse uma oportunidade na terra da pressa e das oportunidades. Aproveitava qualquer minuto vago para sacar um livro da pasta e devorá-lo quase que em ânsia por conhecimento. Obviamente na época não existiam esses celulares que endoidam as pessoas. Líamos livros e muitos jornais de papel.

E essa frase ficou encaracolada em minha cabeça até hoje, como tantas outras, já que tinha o hábito de ler três livros sucessivamente, anotá-los, cataloga-los, além de manter um diário intenso de anotações, datas, momentos, situações e sentimentos. Eu era um “lobo solitário”, quase sectário de Hermann Hesse, por assim dizer, como também me acho hoje, neste presente momento, um “lobo”, porém um lobo calejado e experiente, que espera sua presa em surdina, no calar da noite e se sacia silenciosamente, sem alarde, sem desmantelar o ambiente.

Todo sofrimento, toda humilhação, ofensas e outras asneiras que passamos na vida devido ao inevitável convívio com os outros, são como forjas que moldam nosso espírito e caráter, que nos transformam de alguma forma, tornando-nos mais fortes e consequentemente quase imunes a certas dores e intempéries normais à existência. Não pense que a vida do Cristiano Ronaldo é um mar de rosas! Não pense que a vida de um grande astro ou estrela de Hollywood é magistral, perfeita e que corre como um riacho manso rumo ao oceano. Não! Não pense que a vida de um entregador de pizzas em Diadema seja menos feliz que a deles. O cara pode muito bem levar uma vida mais feliz que a de qualquer um deles, de que a qualquer um de nós! Cada homem carrega seu peso e sua medida. Todo mundo tem seus enroscos, suas encrencas, seus desvios, loucuras e, vamos dizer assim, suas provações. É igual com todo mundo! Usando aquele velho dito popular: “todo mundo tem sua cruz para carregar”, e normalmente a mais pesada delas somos nós mesmos! Nós somos nosso maior peso. Lutamos contra nós mesmos a controlar nossos instintos, nossos momentos de fúrias como aquele personagem de Michael Douglas em “Um dia de Fúria”. Aquilo foi um ataque subido de explosão de nervos. Estourou tudo! E isso acontece todos os dias em todo lugar deste planeta! Tive o desprazer de presenciar algumas. Uma se deu na Rua São Bento em pleno horário de almoço. Uma moça vestindo branco, provavelmente uma enfermeira, alguém da área médica, surtou e principiou a gritar destranbelhadamente, segurando a cabeça e aparentando xingar o vento. Estava desnorteada. Como era São Paulo, a multidão passava, via e fingia que não via.

Ninguém neste vasto Mundo pode interferir em nossos temperamentos caso assim não o permitamos! Você só está sujeito ao que dizem ou deixam de dizer a seu respeito caso absorva aquilo e engula, digerindo e lançando ao espaço em forma de vingança e ódio. Eis a origem da maioria dos problemas! Os homens, quando querem ou quando são impulsionados por sentimentos odiosos, são capazes das mais atrozes crueldades. E estamos sujeitos a elas, nossos antepassados estiveram sujeitos a elas e nossos sucessores também estarão sujeitos a elas. Por mais que se seja um cara frio ou durão, hora outra ou não a mágoa e o ódio humano irão te encontrar num beco sem saída. A não ser que faça como Thoreau e vá para a selva! Do contrário a vida é isso aí, é quase um imperativo, uma guerra diária onde não há como escapar; ou luta, vence ou morre, ou se rende e vive feito escravo, mastigando a própria leniência, esgotando nervos, vísceras, fígado, esôfago e a paciência, sendo que no final do filme todo mundo morre de qualquer jeito!

Na minha opinião flexível de roqueiro, advogado vivido, filósofo de botequim e meio escritor, fico com a primeira.

E vocês?

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 13/06/2019
Reeditado em 13/06/2019
Código do texto: T6671830
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