LEONARDO DA VINCI

Meu nome é Giovana. Desde menina, tenho o hábito de forçar o pensamento para sonhar com algo que gosto. Pode ser qualquer coisa. Mentalizo que mentalizo e a coisa vem no sonho. Certa noite, eu estava com muita vontade de comer bolo de chocolate, daqueles cremosos com cobertura de chantili.

Dito e feito. Pus a cabeça no travesseiro e comecei a mentalizar o danado. Logo adormeci. Bingo! Lá estava eu na festa de aniversário de uma prima comendo o tal bolo de chocolate, idêntico ao que imaginei horas antes. Isso aconteceu outras vezes e sempre com êxito.

O tempo passou. Me formei em Artes plásticas e demonstrei imensa facilidade em línguas. Diziam que eu era CDF, pois não largava os livros. Meu diploma me credenciou e fui trabalhar num museu como assistente de uma curadora. Ela acabou saindo e eu assumi o posto. Fiquei alguns anos e nesse meio tempo fiz cursos de línguas. Vários cursos.

Aprendi Inglês, Espanhol, Italiano e Francês. Tive, por conta disso, ótimas propostas de emprego. Me dei bem. Mas o fenômeno continuava. Agora, ainda mais pretensiosa e ambiciosa do que nunca nos sonhos.

Outro dia, fiz que fiz mentalizando o Leonardo da Vinci. Queria vê-lo, interagir com ele e suas obras. Acompanhar seus estudos. Não deu outra. Me vi descendo uma rua próxima do local onde residia, em Milão/Itália. Subi dois lances de escada e quando me preparava para entrar em seu ateliê, ele parou diante de mim, assustado.

— Por todos os diabos!!! Quem é você! — como entendia italiano foi fácil a nossa conversa.

— Sou a Giovana e quero conhecer seus segredos na pintura. Como fez para pintar a Monalisa? Que recursos utilizou em sua produção?

— La Mona Lisa? AH! AH! AH! La Gioconda, você quer dizer?

— Esattamente! La Gioconda, signore Leonardo!

— Segurando nas mãos um pincel e sua palheta de tintas ele parou e quis saber o meu nome, e como conseguira chegar até lá, principalmente vestida com aqueles… hã… trapos?!!!

— Tive vontade de mandar o Leonardo da Vinci à merda, mas relevei.

Como ele tinha uma mente evoluída para seu tempo, foi bem simples explicar que eu vinha do futuro e que tínhamos celulares e outros objetos sensacionais.

— Ele ficou confuso, mas me ofereci para mostrar a ele as tais engenhocas.

Trouxe-o para as ruas de São Paulo, em pleno Carnaval.

Ele ficou petrificado diante da modernidade, das ruas, aviões riscando os céus…

— Dio Santo! Repetia seguidamente a cada coisa que via. Os trajes das moças com as pernas de fora, as calças jeans dos homens e os carros pelas ruas… tudo o impressionava. Mostrei a ele um celular com som e imagem. Ele pegou o aparelho nas mãos e tentou ver de onde vinham a voz e a imagem. As pessoas nas ruas não ligavam para seus trajes, afinal, estávamos em pleno Carnaval.

— De repente, saída de um bloco do Largo da Batata, surge uma garota com um minúsculo biquini. Ele quase caiu de costas, boquiaberto. Expliquei que isso era comum e que muitas moças fantasiavam-se assim. Com olhos esbugalhados e sem compreender muito bem me pediu para retornarmos ao seu ateliê, pois tinha uma pintura para entregar a um rico mercador parisiense.

Diante do que viu teve sede. Antes de ir embora, levei Leonardo até meu apartamento onde ofereci-lhe um copo de água. Meio assustado tomou o líquido analisando a garrafa e a forma nunca vista por ele. Nos despedimos e ele me disse que voltaríamos a nos falar oportunamente. Do mesmo modo como veio, se foi.

Meu despertador tocou. Mamãe, notando que eu havia acordado, me chamou para o café da manhã. Mas antes quis saber onde eu conseguira aquele pincel e aquela estranha palheta com tintas ainda frescas, acomodadas sobre a mesa.