Linha de chegada

“Eles tiveram dois filhos... pena que não deu certo.”

Ouvia a conversas de duas mulheres entusiasmadas com a história do fracasso alheio.

“Dois lindos filhos. Soube que um se forma em Engenharia no final do ano!”

As vozes alvoroçadas permaneciam ali.

Não pude deixar de pensar naquele casal que eu nunca conheci e que, apesar de ter posto dois filhos no mundo, agora era o casal que não deu certo. Um casal que enfrentou a dificuldade de criar duas crianças. Que passou por duas adolescências, o dobro de festinhas infantis, inúmeras noites mal dormidas e que, no final das contas, era o casal fracassado.

Tentei imaginar quantos conhecidos comentariam o mesmo nos próximos tempos. Tios, tias, primos distantes. Antigos sogros vão sacudir a cabeça na formatura do neto: pois é, não deu certo. Provavelmente, os filhos repetirão o mesmo para os amigos. Talvez até mesmo o casal desfeito narre o fim daquela forma: não conseguimos.

Até que me dei conta que também descrevo meus antigos relacionamentos dessa maneira. E você provavelmente faz o mesmo. Eu, você e o país inteiro.

Seus amigos Laura e André? Não deram certo.

E aqueles do trabalho, Pedro e Rita? Também não.

Mas e os filhos?

E a loja que abriram juntos?

E os quinze anos de relacionamento?

Ah, não deram certo.

No final das contas, reduzimos toda a complexidade de um relacionamento a uma exigência absurda: a de que um casal só é bem-sucedido quando dura para sempre.

Fechamos os olhos para as conquistas, o amadurecimento, os anos de cumplicidade, as contas pagas em conjunto e decretamos o fracasso alheio. Ou o nosso próprio.

Declaramos que não fomos bem-sucedidos enquanto esquecemos que relacionamento que deu certo é aquele que fez bem. É aquele em que houve compreensão no final de um longo dia. Conversa na hora do jantar. Risadas no telefone.

Esquecemos que relacionamento que deu certo é aquele que fez sentido para o casal.

E, sabe: nada precisa fazer sentido para sempre.

Na verdade, quase nada faz. Você muda. Seu parceiro muda. Aquele homem que você conheceu há cinco anos não é mais o mesmo. Você também não é a mesma. Aquela mulher com quem você se identificava a alguns anos atrás não pensa como antes. E sabe o que mais?

Talvez você vá comemorar bodas de ouro com a sua atual namorada.

Talvez vocês entrem com os papéis do divórcio daqui a cinco anos.

Talvez o seu relacionamento acabe depois de amanhã.

Independente do que acontecer, abandone a ideia de que dar certo é a mesma coisa que durar para sempre.

Lembre-se que dar certo tem muito mais a ver com felicidade do que com durabilidade. Podemos dar certo com alguém por um dia, um mês ou uma vida inteira.

O que não podemos é estacionar em um relacionamento infeliz no desespero de provar que ele foi bem-sucedido. Afinal de contas, aquelas bodas de ouro da sua avó podem ser um carimbo de felicidade conjugal ou a prova de que vivemos em um mundo que ainda associa a eternidade com felicidade.

Esqueça as fofocas da família. Esqueça os comentários no provador da loja. Esqueça os anos que se passaram ou os que deixaram de passar. No final do dia, a única pessoa que pode afirmar que seu relacionamento deu certo ou não é você... E que nunca esqueçamos: "dar certo" nem sempre significa dar certo.

Lívia Couto
Enviado por Lívia Couto em 03/07/2019
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