TEATRO DE REVISTA

COMPANHIA JARDEL & TANGERINI

Nelson Marzullo Tangerini

Durante todos esses anos, a imprensa brasileira e escrevinhadores da história do Teatro Brasileiro citaram o empresário Jardel Jércolis, pai do ator Jardel Filho, como sendo o autor das peças No tabuleiro da baiana, Estupenda!, Na dura! e Gol!, de 1937, quando são, na verdade, de autoria de Nestor Tangerini.

Tangerini contou para Dinah, minha mãe, que contou para mim, que, nos cartazes das peças, o nome de Jardel aparecia em letras garrafais, enquanto o nome de Nestor Tangerini aparecia em letras menores, o que dava a entender que o empresário era o autor dessas peças.

No início, Tangerini fingiu não perceber o que estava acontecendo, até que tomou a decisão de abandonar a companhia teatral do amigo.

Conhecidamente turrão, Tangerini jamais voltava atrás em suas decisões. Deligou-se da Cia. de Jardel Jardel alegando, primeiramente, motivos pessoais. Uma trova, porém, escrita pelo teatrólogo para o livro de trovas Pontas de prego, engavetado e jamais publicado, pode, talvez, revelar sua decepção com o empresário, que até hoje é tido como o autor dos esquetes das suas peças.

Eis a trova – devastadora:

“J. J.

É figura da ribalta,

escritor, maestro... Em suma:

é tudo, nada lhe falta

para não ser coisa alguma...”

Muitos esquetes dessas peças foram publicadas, em 1947, na revista de humor e sátira O Espêto, dirigida por Nestor Tangerini e o jornalista e poeta baiano Lourival Reis, mais conhecido pelo pseudônimo Professô Zé Bacurau.

Como se tudo isto não bastasse, Tangerini deixou um livro manuscrito em que prova que todos os esquetes escritos para a Cia. Jardel Jércolis são de sua autoria.

Outros erros aconteceram também nas biografias de Grande Otelo, escrita por Sérgio Cabral [pai] e de Oscarito, de Flávio Marinho, bem como no livro Viva o rebolado, vida e morte do teatro de revista brasileiro, de Sylviano Cavalcanti de Paula.

Oscarito trabalhou em Ganhando tempo..., Goela de Pato e Gol!, peças com esquetes de Nestor Tangerini. No tabuleiro da baiana [com as estrelas Grande Otelo e Déo Maia no elenco], não era uma peça de Ari Barroso; a música, sim, era de Ari, mas os esquetes da eram todos de autoria de Tangerini.

Na peça Gol! Jardel pôs no palco uma partida de futebol de meninas [uma delas a atriz Dinorah Marzullo, cunhada de Tangerini]. Dinorah, minha tia, me contava que o juiz da partida era Oscarito, e que o empresário acabou pondo uma tela entre o público e a plateia, pois o público não devolvia a bola. A atriz me contou ainda que Mário Lago participou de uma aposta sobre qual menina faria um gol na partida. Mário apostou em Dinorah e ganhou a aposta.

A peça seguiu para a Argentina, fez muito sucesso e mereceu destaque do jornal La Nación. Dinorah, porém, não seguiu com o grupo por ser muito nova e não ter permissão de sua mãe, a atriz Antônia Marzullo, para viajar.

Já Sylviano Cavalcanti de Paula escreve que No tabuleiro da baiana foi um fracasso, o que não é verdade, se lermos os jornais da época.

Sérgio Cabral e Flávio Marinho podiam evitar tais erros, em suas biografias de Grande Otelo e Oscarito, respectivamente, uma vez que enviei a essas pessoas o meu livro Perfil quase perdido – uma biografia para Nestor Tangerini. Escrito com a colaboração da ex-atriz Dinah Marzullo Tangerini, minha mãe, o livro foi registrado em 2000 pela Biblioteca Nacional.

Durante todos esses anos, venho publicado toda a obra de Nestor Tangerini, meu pai, pelas editoras Nitpress e Autografia. Primeiramente, dediquei-me a publicação de sonetos [líricos e satíricos] e crônicas, como Dona Felicidade, Humoradas e Sobre o beijo. Estão em gestação outros livros contendo poemas, monólogos e letras de músicas [Ideia Sinistra] e caricaturas em estilo cubista. Um livro contendo seus esquetes, também está em gestação. “Esquetes e cortinas” mostrará esquetes de autoria do autor, que foram plagiados e apresentados no teatro e na televisão.

Ainda esperamos que Nestor Tangerini seja reconhecido depois de sua morte e que a mídia abra suas portas para este autor que lutou brava e dignamente contra todas as adversidades da vida: era deficiente visual [não tinha a vista direita] e físico [não tinha o braço esquerdo]. Seu talento é inegável: foi um grande artista, além de ser um exímio professor de língua portuguesa.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 13/07/2019
Código do texto: T6695150
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