Musa

Estava pronto. Após algumas semanas recheadas de insucessos, frustrações e falhas, finalmente a ideia estava expressada a contento no papel. É claro que, como sempre, foi necessário o sacrifício de uma boa folha, de um bocado de sua insubstituível tinta inencontrável, e de seu precioso chá de flores, mas valeu a pena no fim das contas.

Obviamente aquela não era sua melhor obra, afinal de contas nenhuma delas era, mas já merecia um lugar dentre os trabalhos guardados na “pasta verde”, e quem sabe viesse até mesmo a merecer uma moldura num futuro próximo, contanto que harmonizasse com aquilo que sua irmã apresentasse para a exposição.

Com a obra concluída bastava apenas uma etapa, as malditas críticas, sempre lá para confirmar todos os pequenos defeitos já muito bem conhecidos da produção, mas parte necessária do processo, afinal, as coisas sempre são mais belas aos olhos de quem as fez, e o mundo da arte é construído com as opiniões de pais que nunca tiveram filhos e encontram todo tipo de malcriação nas crianças alheias.

Assim, como sempre, ele apresentou o recém nascido a colega de profissão. Ela, mais bem sucedida do que ele e mais experiente, saberia se aquela era uma obra que valeria a pena receber um nome. Ela analisou a criança, indagou sobre o conceito e a estética, e por fim concluiu que sim, valia a pena dar um nome aquele filho.

A obra foi então batizada e poupada de apotheta, mas as etapas de avaliação ainda não estavam concluídas, a irmã ainda precisava dar seu crivo, já que ele pretendia incluir aquela folha a mostra que ambos dividiriam. Ela, a apreciou, e permitiu que ela fosse pareada com suas próprias criações.

Assim tudo estava resolvido. A obra recebeu seu nome, sua proteção, e foi devidamente guardada junto às demais. Por mera curiosidade, e sabendo que seu trabalho, ao menos no que se dizia respeito aquela ideia, estava concluído, ele a mostrou para Ela.

A opinião dela não mudaria nada. A obra já estava selecionada, inclusa e reservada, mas ele estava curioso, e Ela sempre disposta há gastar seu tempo observando seja lá o que as mãos dele faziam. Ela observou, refletiu, e disse “está linda”. E assim ele foi dormir, tranquilo e contente, sabendo enfim que havia feito um bom trabalho.

Schrodinger
Enviado por Schrodinger em 16/07/2019
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