O DOMINGO E O VÔO DA BORBOLETA

O domingo sempre volta. Ele insiste em voltar. Um dilema de gravíssima proporção sempre me atinge, aos domingos: almoçar em casa ou almoçar fora. Tenho preguiça de almoçar fora, e não tenho preguiça de fazer almoço. O problema é que nunca sei o que fazer, além do trivial da semana. Fico buscando em meu restrito cardápio, saudavelmente correto, uma opção que não tenha cara de segunda feira e sempre acabo no arroz, carne assada e maionese. Carne e maionese nem tão saudável assim, mas é domingo e domingo tem que ser exceção. Essa mania de achar que o domigo tem que ser exceção é outra coisa que me consome os neurônios. Domingo é um dia como outro qualquer. Eu não tenho obrigação de descansar aos domingos, até porque não me canso mais durante a semana. Mas quando olho para fora, para a natureza no jardim, algo me diz que hoje é domingo. Então pego carona na idéia do domingo e fico meio sem jeito, sem saber o que fazer com ele. Minha incompatibilidade emocional com o domingo é antiga, quase ancestral. Já fiz pão integral aos domingos. Domingo era dia de pão. Já fiz visita aos domingos. Domingo era dia de visita. Domingo, também, já foi dia de levar as crianças ao Tênis Club. Domingo já foi dia de reunir a família em volta da mesa do almoço. Comida de mãe, que delícia! Comida da minha mãe... Mais tarde, domingo tornou-se o dia em que eu fazia aquela lasanha que as crianças amavam, e que agora eu abomino porque me traz gosto de saudade. Domingo é dia de ruminar. Dia de reminiscências, de lembranças, de fazer nada, de olhar para trás. Eu não gosto de olhar para trás e quando olho para a frente, ali está, de novo, o domingo, uma ameça silenciosa ao meu recém alçado vôo de borboleta, que acontece toda segunda feira. Domingo é uma idéia que guardo a sete chaves na cabeça para não deixar chegar ao coração. O que não me impede a dúvida: almoço fora ou faço almoço?

Ana Ribas
Enviado por Ana Ribas em 27/09/2007
Reeditado em 08/11/2008
Código do texto: T670426
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