Me Perdi Entre os Poemas

Me Perdi Entre os Poemas

Santa Isabel, 21 de setembro de 1995.

Santa Isabel, 21 de setembro de 2019.

No período entre essas datas, eu me perdi entre as minhas próprias poesias.

Hoje é meu aniversário de 24 anos.

Quem me conhece sabe que eu detesto aniversário.

De repente sou velho demais pra morrer jovem, acho que não da mais tempo que ser um astro do rock e muito menos jogador de futebol.

Eu não gosto de aniversários porque tenho um serio problema com o “passar do tempo”. Me vejo cada vez distante do passado e cada vez mais perto do que eu enxergava como futuro.

Enxergo isso de maneira muito nítida na aparência dos meus pais.

Eu quis ser músico.

Eu quis ser jogador de futebol.

Eu quis ser.

Me tornei advogado.

Eu sempre acreditei em um monte de coisa que muitas pessoas ignorariam. Eu sempre ignorei aquilo que muitas pessoas acreditavam.

Eu sempre acreditei que numa sola de sapato tem mais conhecimento que em todas as páginas de um livro, que as fotos expostas na estante tem mais história que um museu inteiro e que nos erros de uma pessoa considerada comum tem (ou deveria ter, pelo menos) mais aprendizado do que em todos os anos de escola.

E a vida seguiu assim.

Esse ano faria 10 anos. Foi num primeiro de novembro de 2009. Eu corri atrás daquilo que eu julgava ser correto.

Eu prefiro acreditar na teoria do povo maia, em que o mundo acabou em 21/12/2012. Prefiro esquecer que, em algum lugar e em algum momento, alguém interpretou errado o que eles quiseram dizer.

Acho, por vezes, até um insulto me autointitular de escritor.

Hoje já tenho alguns problemas antes considerados “de velho”.

Eu preciso usar óculos, mas prefiro acreditar que isso é delírio do meu oftalmologista e que um dia desses tudo volta ao normal. Eu, por algum motivo, simplesmente prefiro ignorar o fato de que os anos estão se passando.

Na realidade, na infancia eu comecei a escrever com uns 12 anos pra impressionar a menina que eu gostava.

Na adolescência, eu continuei escrevendo pra desabafar minhas rebeldias sem causa.

E hoje, escrevo pra tentar entender os motivos.

“Do que?”, podem perguntar.

Não sei, simplesmente os motivos. Mas em específico entender os motivos do porque eu (e vocês) estamos aqui.

Entender as razões. Os motivos. O rumo. O sentido. Os porquês. A direção.

Se eu nunca encontrar o sentido da vida, vocês que me desculpem, mas eu vou morrer procurando. Não é ficar rico, senão milionário não morria. Acho que vocês entendem o que eu quero dizer.

É impossível que o sentido das coisas seja nascer, crescer, estudar, estudar mais, trabalhar, ter filhos (ou não), acumular patrimônio (ou matrimônio, em alguns casos) e morrer. Se for isso, minha vida é uma grande frustração a qual eu ainda desconheço.

Em algum lugar deve existir o adolescente que postava umas crônicas aqui quase 10 anos atrás. O bom de ter permanecido aqui por todo esse tempo é poder ver meu amadurecimento.

Acreditem ou não, um dos meus passatempos favoritos é visitar meus antigos escritos e relembrar os motivos da criação e existência de cada um deles. Afinal de contas, todos tem uma história por trás. Algumas delas maiores que alguns museus que eu já visitei. É uma sensação bem gostosa. Uma nostalgia boa ao lembrar, na maioria das vezes sorrindo por dentro, com o coração cheio de bons sentimentos, das situações que nunca mais acontecerão novamente. E que eu sobrevivi, inclusive. Por isso a graça.

Se eu tivesse ficado pelo caminho, com certeza não agiria dessa forma.

A sensação do improvável mexe comigo, enquanto a certeza do “nunca mais” me deixa sem chão.

O que eu mais queria que existisse era uma máquina do tempo.

Já escrevia antes, mas postei meu primeiro texto aqui num doze de abril de dois mil e nove. O último, há alguns meses. São dez anos de diferença. Que pra alguém da minha idade é coisa pra caralho, com o perdão do termo.

Antes, um adolescente de 13 anos, rebelde que quase reprovava na escola ano sim e no outro também, que achava que ia mudar o mundo, que jogava bola todos os dias e que passava horas no MSN, orkut e windows media player quase em looping.

Hoje, aos 23 - 24 agora - advogado, mais maduro, muito mais crítico, que ainda acha que vai mudar o mundo e perplexo sobre o que está fazendo aqui e o que está, de fato, acontecendo lá fora. E se cada pessoa tem seu próprio universo, imagina quantos eu tenho que mudar.

E, sinceramente, tento mudar o máximo de mundos possíveis. Por vezes fracasso. Mas sigo tentando.

Sempre me lembro dos melhores dias de todos. É um tanto quanto estranho pensar que quando somos mais jovens, queremos crescer logo. Poder dirigir, entrar no motel, consumir bebidas alcoólicas, comprar cigarro... esqueceram de contar a parte mais cruel: contas pra pagar, bons modos pra manter, horario para cumprir e metas pra bater.

De alguma forma meus pais ainda são a tônica da minha vida, mas eles não podem mais ditar o ritmo. Eles escolheram minhas escolas, mas não minha profissão - embora incentivassem muito. Eles escolheram minhas roupas, mas não meu estilo. Eles negaram mais um copo de refrigerante durante a refeição e um último chocolate depois, mas não podem mais evitar as “últimas doses”, o último shot ou a famosa saideira que acaba comigo no dia seguinte. Eles me aconselharam sobre quem era boa gente e quem, na visão deles, não era. Mas também nunca escolheram meus amigos ou minhas namoradas.

Entretanto, as dicas deles me fizeram escolher os melhores amigos e, de alguma forma, boas companhias. E hoje, com alguns arrependimentos, uma decisão definitiva.

Eles me deram todo um suporte para que eu pudesse chegar aqui.

O que eu mais ouvia durante a infância era algo no sentido de “você tem condições de chegar aonde eu não pude”. E tenho, realmente.

Mas eu me pergunto todo dia se vale a pena mesmo.

Eu trabalho muito. (Mais que obrigação, podem dizer). Mas eu já disse que obrigação, pra mim, é respeitar os outros. De resto, fazer porque gostamos ou convem.

Acordo muito cedo. Durmo muito tarde. Me seguro em energético, quais sejam, durante a semana. Meus finais de semana já não são como eram outrora. Pela boa-ganância, passo algumas horas do sábado enfurnado no meu próprio escritório plantando algumas sementes que pretendo colher no futuro. Mas é preciso regá-las.

Talvez valha.

Eu nem lembro qual a última vez que me juntei com todos os meus amigos pra tomar uma cerveja. Está sempre faltando alguém. Isso porque um ainda mora do outro lado do mundo, outro é pai, dois não se falam mais e um outro ainda virou evangélico.

A minha dúvida é se o futuro nunca chegar. Teria sido tudo isso inútil? Em vão?

Fica o questionamento.

Não estou dizendo que mereço mais ou menos que meus pais. Mas a juventude deles parecia ser mais legal. Mais simples, mas mais legal.

Não sei mais com que cabo levo a minha vida - talvez nunca tenha entendido - e afirmo que em algum momento eu me perdi entre as minhas próprias poesias. Não consigo mais diferenciar escritor de personagem. No meio dessa bagunça toda, ainda existe (ou pelo menos existia) um eu-lírico bem filho da puta.

Talvez tenha sido no Sem Título I, II ou até mesmo na Rosa dos Ventos, que marcou uma mudança significativa na minha vida.

Obrigado pelas memórias, mas dei os primeiros passos de mãos dadas com alguém que me ajudou num quebra cabeça algumas crônicas atrás. Eu tenho comigo que alguma coisa eu preciso deixar pra eternidade. Que sejam escritos, então. Como a bíblia, por exemplo. Ou as escrituras dos antigos escribas, quem sabe. Afinal, escrevente eu também já fui. Hoje prefiro prefiro lutar por mim e pelos outros. Hoje prefiro escritor.

Eu já precisei dizer adeus pra um monte de gente que eu queria que ficasse. Mas eu sempre digo: minha vida é uma eterna “idas e vindas”.

Tem sempre alguém se despedindo e quase sempre alguém sentando na mesa e se apresentando.

Eu já disse que, pra mim, nós morremos três vezes:

A primeira é aquela geralmente triste - pra quem fica - quando nosso coração para de bater.

A segunda é quando ninguém mais falar o nosso nome.

A terceira é quando ninguém mais escrever o nosso nome.

A primeira é questão de tempo, eu sei. Já me preparo pra isso desde quando eu criei noção do que significa a palavra. “E quando eu morrer?”, me perguntava. Quem vai ficar com os meus brinquedos, que depois viraram camisetas, tenis e cds, que hoje viraram clientes, escritos, escritório e problemas.

A segunda é questão de mais tempo. Quando eu partir, alguma coisa eu hei de deixar. Alguns amores e amigos vão ficar aqui. E é aí que eu me torno lembrança. É aí que eu me torno saudade. “Eu serei saudade” é uma das frases que já pensei em por na minha lápide.

A terceira, no que depender de mim, nunca vai acontecer. Eu quero uma rua com o meu nome e por que não meu nome numa certidão de nascimento? Eu quis deixar bens. Eu quis deixar dinheiro. Eu quis deixar imóveis. Eu quis deixar meu invetário uma verdadeira zona. Eu quis deixar uma carreira sólida. Hoje eu quero deixar saudade.

Saudade daquele conselho, daquela piada, daquela cerveja, daquele abraço, daquele amasso, daquele tiro, daquela barba.

Se eu não sei o que estou fazendo aqui, por que ficar, então?

Porque é justamente essa a resposta a qual eu não tenho que me mantém mais vivo do que nunca.

A vida é desafio, encontro, desencontro, certeza, incertezas, alegrias, frustrações, buscas, perdas, sofrimentos, enganos e desenganos.

Tudo isso num eterno e permanente processo de “estar sendo”, se conhecendo e tentando se entender, buscando o nosso eu - a energia primeira da vida.

Vivemos a todo instante descortinando o véu que nos faz pequenos.

Somos seres em contínua construção. E precisamos continuar.

Eu nunca entendi o mantra “vencer na vida”. Eu sempre quis apenas viver.

Sem competições, embora goste muito de ganhar.

O que é vencer na vida?

É ter um salário de 5 dígitos. É ser famoso. É ter títulos. É alcançar o inalcançável. É ter uma família estruturada. É viajar o mundo. Enfim, num consenso, tem uma pluralidade de definições, mas para mim, tem um significado bastante singular.

Aproveitar ao máximo. Deixar minha marca, seja ela qual for.

Mas, evidentemente, como meus pais me ensinaram, a melhor e mais positiva possível.

Melhorar.

Fazer o bem.

[principalmente] Estar.

Ser, um dia, saudade.

Talvez seja isso.