Relato de um ativista de internet: os modernos homens do subsolo
Acordo incomodado com algo. Levanto e continuo pensativo por algum tempo. Pode ser que esse incômodo seja por causa da atual situação política, alguma revolta pelas coisas como elas estão, a crescente onda de violência. Penso um pouco e decido a minha ação, vou criar uma hashtag e colocar o que penso sobre tudo isso nas minhas redes sociais. Não sei como é com as outras pessoas, mas isso me alivia muito. Após isso consigo fazer minhas atividades, e continuar minha vida.
Tornei-me um ativista de internet, expondo minha opinião sobre todos os assuntos, mesmo não conhecendo assunto nenhum a fundo. Transformo quem não concorda comigo no vilão da história, pois sei muito bem que a minha verdade é indiscutível. Sei que faço mau uso de uma ferramenta que deveria ser usada para criar um espaço de discussão, porém o conflito deixa as coisas mais dinâmicas, até porque estou protegido no conforto de minha casa, de frente da minha tela, bebericando algo enquanto vejo o caos criar corpo. Somos os modernos homens do subsolo, afastados de tudo que não é do nosso agrado (os algoritmos do Google e Facebook tem papel vital nisso). Se algo ou alguém me desagradam em um click eu apenas os excluo.
O subsolo moderno são os espaços virtuais, que dão a falsa impressão de intimidade, de proximidade. São onde aprendemos a nos relacionar. O melhor desse lugar é a imagem que posso criar. Menos “ser” e mais o que “eu pareço ser” - as possibilidades são quase infinitas-. Alguns me enxergam como um diletante, buscando o bem ao promover um discurso de igualdade, de busca de nossos direitos. Apenas os direitos, os deveres não interessam a ninguém.
Do subsolo, ou refestelado no meu sofá, vejo com espanto que nada me espanta mais. O mundo começa a me entediar, a humanidade parece banal e é como se tudo se resumisse a um grande vazio. Nesse ínterim crio mais uma campanha #salvemaslagartixasalbinasdaáfrica.
E nem precisa fazer sentido, só precisa parecer descolado.