A vitrine da literatura

É notável como a literatura pode mostrar diversos fatores de uma sociedade e uma época em que é escrita. A composição de elementos, como as condições políticas, econômicas e sociais, por exemplo, contribuem com a escrita e o imaginário de um seleto grupo de escritores que, muitas vezes, se tornam engajados em mostrar a verdadeira e dura realidade de onde vivem, colaborando para mostrar certos condicionamentos e comportamentos sobre a grande falta de preocupação de colocar em prática políticas públicas capazes de ocasionar eficientes os objetivos de colocar em prática causas justas e eficazes para todos.
Tendo em vista alguns elementos históricos, é perceptível que um assunto ganha notoriedade e grandeza a partir do momento em que é posta às vistas de cada indivíduo e, consequentemente, as discussões se multiplicam cada vez mais. É fato que, durante o período pós-moderno, houve crescente debates sobre a condição da literatura, tendo em vista os desmontes de algumas situações históricas e políticas que permitiram críticas ideológicas sobre a definição de cultura, principalmente após acontecimentos pós-revolução industrial e após a Segunda Guerra Mundial, períodos em que o processo de desconstrução da sociedade, que se fragmentava aos poucos. Segundo Zygmunt Bauman, as pessoas passam por um momento de pura ansiedade por meio do qual tudo é um sentimento líquido e nada pode ser deixado para depois. Os sentimentos se esvaem e se destroem aos poucos, e o sujeito passa por uma descentralização ao mesmo tempo que passa a ser sujeito paciente de suas ações, sendo assim dominado por um mundo globalizado onde somente o progresso não importa, mas o status quo do sujeito.
Os debates culturais entram em jogo a partir do momento em que manifestações se fazem necessárias para se verificar a real necessidade de nossas ações ao longo de nossa jornada. A literatura, por exemplo, se demonstra como um modo de representar a sociedade e seus diversos comportamentos que se distinguem de acordo com a necessidade de cada geração. O desejo de se modificar determinadas situações aumentam a cada vez que algo sai dos eixos e nos desmorona. A partir daí, as numerosas intervenções artísticas se mostram capazes de demonstrar os nossos anseios por meio de sua performance, no entanto, pergunto-me, até que ponto uma criação cultural por manifestar o condicionamento de uma geração? Percebemos que, ao longo dos anos, as culturas foram se desenvolvendo de acordo com as necessidades e as ideologias presentes. A configuração de uma cultura se edifica aos poucos, e a cada passo dado é perceptível os variados tipos de relações e as diferenças sociais, manifestando-se, assim, a Política, a Economia, a Psicologia, a Filosofia da sociedade que representa essa cultura.
É notório, nesse sentido, que na configuração de uma obra literária ocorre a influência de diversos fatores externos - sociais, políticos, ambientes, costumes, por exemplo - e interno - a própria criação literária. Há aí uma relação entre a obra e seu condicionamento social que é visto como um ponto crucial para a entendê-la até certo momento do século XX. A estética de uma obra pode ser vista, por meio dessa influência social, como um dos fatores que determinam o valor da obra em um sentido literário no que diz respeito a sua receptividade em um determinado público-leitor. Podemos dizer que uma manifestação artística mostra um teor social em dois sentidos: depende de como os fatores do meio agem e se comportam de várias formas na obra; e passa para seu leitor um efeito que transforma seu comportamento e visão do mundo ao discutir certos valores sociais.
A literatura, assim como outras manifestações artísticas, age como se fosse uma vitrine do mundo, mostrando a estrutura social como modo de definição da posição social do escritor cujos valores e ideologias estão presentes em sua obra. Percebe-se que uma obra apresenta em sua configuração elementos que exemplifiquem características sociais, de acordo com a posição do autor na sociedade e sua relação com o público. Como Antônio Cândido discutiu, forma-se uma tríade indissolúvel em que o autor se apresenta como um intermediário entre a sua obra e o seu leitor. Assim ocorre o processo de criação literária e de propagação de leitura em que manifestam-se valores e ideologias de seus agentes: autor, obra e leitor.
Ricardo Miranda Filho
Enviado por Ricardo Miranda Filho em 21/10/2019
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