O Dom

Nada tinha de seu. Mas tinha um dom.

Estabelecia à sua volta uma atmosfera emocionante, em cada pessoa provocava uma sensação diferente. Ampliava nelas os sonhos e as esperanças. Despertava todo o tipo de paixão.

Um Dom

Olhando assim despretensiosamente, nada se percebe, mas bastava a aproximação, uma conversa e tudo mudava. Houve quem se apaixonasse, ficasse dependente, ou simplesmente jamais esquecesse. Havia quem resistisse ao encantamento para em seguida render-se confessadamente admirado.

Realmente um Dom.

Muitas histórias.Todas as histórias, com um final em comum. As luzes apagadas, cortinas fechadas. Escuridão na ribalta. Apenas a solidão das coxias. Ficam os odores, os sons fugidios. E as lembranças.

Ele tinha um Dom.

Um personagem, muitos personagens.

Um solitário.

Abandonado nas emoções de muitos, lembrado no abandono de alguns, presente na lembrança de todos.

Isso era um Dom.

Caminha só, ouvindo os próprios passos e repleto de abandono. Pelo olhar, desfilam momentos. No corpo ainda o calor da paixão. Nos lábios o beijo negado. Nas mãos, fugidias oportunidades, todas elas.

Sangrando, esvaindo-se. Vendo escorrer pela sarjeta, a felicidade.

Enfim, de que serve ter um Dom, a não ser fazer felizes os outros?

Ele tinha um Dom.