A moça dos copos

Manhã chuvosa de novembro...

Em uma sala ampla, durante a apresentação de um Congresso; ao lado da pequena mesa de madeira, a moça e seu sorriso imóvel, qual sentinela permanece, cuidando atenta de uma bandeja com copos d'água. A transparência do plástico contrasta com a tampa de alumínio...

Os copos em fila e formando um retângulo lembram uma produção em série todos iguais e, com o mesmo destino: aplacar a sede de algum participante da palestra que resolva deixar, por segundos, sua confortável cadeira e aventura-se, na medida do possível, em silêncio e caminhar até a mesa e pegar, um dos mencionados copos.

A moça - feito um antigo e lindo vitral - com seu sorriso treinado, move-se um pouco, e assim que o homem se afasta, ela depressa arruma a fileira, reorganizando - os, lado a lado, as peças do seu montado “quebra-cabeças”... Continuo escutando a palestra, mas a imagem da bandeja com os copos, aparentemente simples e tão presente em diversos espaços de estudos e apresentações inspira-me significados: vivemos a maioria das vezes, em um mundo premeditado, com as horas dos dias e noites, pontualmente divididas em atividades, repletas de expectativas e aceitação.

De certa forma, as pessoas são como as gotas no copo d’água com destinos traçados, pensamentos programados, dependendo, entretanto, da capacidade de superação e despertar de cada um em sair da "formatação retangular na bandeja...”

A moça que os organiza lembra-me as mãos que seguram e movem os atemporais fios de um fantoche – Vida manipulada induzida pela mídia, incansavelmente, pré - fabricada... Enquanto assim divagava, a chuva aumenta sua intensidade e os sons das gotas, deslizando na janela silenciam-me.