Um livro delicadamente lindo.

Muito me recordo da minha juventude. Pouco dinheiro era uma constante, mas eu conseguia guardar algumas moedas para, um dia, comprar livros. A livraria Brasiliense na rua Barão de Itapetininga, no centro de São Paulo, me fascinava e foi lá um dos lugares que mais me senti ínfima, deslocada, capaz de ter pleno conhecimento da minha pequenez e ignorância. Eu olhava as prateleiras abarrotadas e me sentia indigna de conhecer parte daquele universo profundamente enriquecedor, criativo e belo.

A cada livro que conseguia adquirir era como uma festa, sempre carregada de simbolismo. Logo encapava a obra com um respeito, diria, divino. O livro não poderia passar a exibir uma capa manchada, nada de rasuras, apenas os grifos a lápis seriam admitidos, mesmo assim, tênues, como se feitos por mãos infantis.

Foi difícil eu conseguir doar livros. Tão difícil como comprá-los. Eles eram parte do meu coração um tanto sonhador e esperançoso. Um coração desejoso de se fazer adulto e contribuir para que o mundo fosse menos agressivo, mais risonho, humano, enfim. Mas doei sim, às centenas, e isso também me fez bem. Eu os queria em mãos de sonhadores, transformadores e que as pessoas se tornassem mais justas, equilibradas e pacíficas através do conhecimento.

Acabo de ler um livro especialmente belo. Uma obra extremamente pontual e justa para compreendermos não propriamente a história do país, mas para podermos olhar fixamente nos olhos de um cidadão e sabê-lo gigante em humanismo e espiritualidade. Mas , humildemente digo: eu já sabia disso e já havia afirmado algumas vezes. Eu dizia que Lula fora o único presidente verdadeiramente cristão que esse país tivera.

Aliás, quando da prisão do Presidente Lula, eu puxei uma oração pela sua libertação e por justiça e fui moralmente apunhalada por algumas colegas. O pior de tudo: numa Pastoral. Parece inacreditável, mas foi isso.

O nome do livro: “Lula e a Espiritualidade – oração, meditação e militância”. Livro organizado pelo jornalista Mauro Lopes, Kotter Editorial/Editora 247, e conta com textos de religiosos de diversas matizes, como católicos, budista, candomblecista, muçulmano, evangélico tradicional, metodista, rabino. Enfim, vários credos de imensa presença e importância histórica se fazem representar e analisam a espiritualidade do Presidente Lula quando trabalha o sagrado na proposta da partilha, da dignidade do pobre, do negro, indígena, de todas as minorias deste país tão sofrido e desigual. A proposta no coração e no fazer político de Luiz Inácio, cuja elite do atraso odeia e tantos outros setores da sociedade também esconjuram.

Um livro belíssimo e carregado de luzes! Em alguns anos, caso os futuros jovens entrem em contato com uma obra de tal magnitude, perguntarão: como pode uma grande parte da sociedade abominar um homem assim? Por que eu ouvi menosprezo, deboche e piadas a respeito desse cidadão?

Teremos que dizer a esses futuros jovens que Jesus também foi condenado sem provas (provas?), aprisionado, morto pelos homens de bem daqueles tempos. E que a hipocrisia nos absorve, nos envenena e nos empobrece. E o que precisamos fazer? Compreender as mazelas dos corações de homens e mulheres, dialogar com afeto e jamais banalizar toda e qualquer forma de agressão, de racismo, e que tenhamos coragem de sentir asco pela falsidade, pela mentira e que saibamos ter a humildade e a força de construirmos paz e justiça com fé e alegria.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 01/12/2019
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