Crônicas de Uma Autobiografia

Meu amor à literatura começou cedo. Aos seis anos, de tanto azucrinar minha irmã mais velha, acabei sendo alfabetizada por ela, na base do carvão na parede - para desespero de minha mãe - e prego no chão de terra batida do quintal.

Dava aulas imaginárias para alunos imaginários, esperando o tão sonhado momento de ir, finalmente, à escola.

Como não tinha acesso a nenhum tipo de leitura, com exceção da cartilha da escola, lia rótulos de margarina, bulas de remédio, jornal velho que embrulhava a carne do final de semana.
Era engraçado ler "notícia vencida", em voz alta para o meu pai, que babava diante da filha futura professora.

Ainda não havia biblioteca na cidade, nem na escola e, para minha sorte, meu irmão foi trabalhar numa livraria e, como naquela época, das revistas não vendidas eram devolvidas somente suas capas à distribuidora, as ditas cujas ele me dava de presente.
Me lembro de "Seleções", ainda viva e que agora tenho assinatura.

Ganhei meu primeiro livro quando "me formei" na quarta série, da Dona Delma, a melhor professora de todos os tempos, "pela excelente aplicação". Foi meu melhor presente. E minha melhor dedicatória.
Um livro grosso, "Biografias de Personalidades Célebres", que li, reli e guardo com o maior cuidado.

Vieram as bibliotecas e a falta de tempo.
Ganhei uma coleção de cinqüenta clássicos de meu sogro quando me casei e confesso que li uns vinte, não mais.
Sei que vou ler todos. Quando, não sei.
Vieram os livros, fartos, desejados, e foi-se o tempo ocioso da infância e juventude.
Vieram os livros e o trabalho, a responsabilidade, a faculdade, os filhos, mais trabalho e menos tempo.

Meu pai usava um "provérbio mineiro" que cabe bem aqui:
"Deus dá a farinha, o diabo carrega o saco."
Cidinha
Enviado por Cidinha em 05/10/2007
Reeditado em 23/09/2009
Código do texto: T681521