Silêncio reparador


Cipolla

Marcelo é um rapaz classe média,filho único que mora com os pais num condomínio fechado classe A. Cabeludo,meio desengonçado,a cara cheia de espinhas e um hobby:tocar bateria.
Treina desesperadamente.Segundo os vizinhos, quanto mais estuda pior fica.Parece que ele só sabe tocar um exercício apesar de no estudo de bateria os exercícios serem muito parecidos.De qualquer forma,para falar a verdade, os vizinhos estão cansados da bateria do Marcelinho.
O condomínio todo não suporta mais o barulho produzido pelo nosso “artista”.
Jovem rebelde, resolve estudar nos horários os mais impróprios.Segundo ele,quando vem a “inspiração”,que por coincidência só vem na hora da novela,aos sábados de madrugada,etc...nas manhãs de domingo,etc.
Seo Oswaldo, vizinho ao lado,já pediu várias vezes,e diga-se de passagem sempre educadamente à mãe de Marcelo para que o convencesse a tocar em outros horários e em outros dias,uma vez que a bateria do rapaz estava incomodando e muito o descanso dos condômínos.A mãe alegou que o menino é um talento e que não poderia ser incomodado com rigidez de horários: “Sabe como é a juventude precisa se expandir... justificou a mãe do “atista”com um misto de orgulho e satisfação nos lábios.
O pai de Marcelinho,um sujeito meio desligado, não dava bola aos pedidos insistentes dos vizinhos e segundo alguns,o homem já estava meio surdo e os estudos do filho não o incomodavam.
Nas reuniões de condomínio a grita era geral contra o adolescente baterista.Chegaram até a sugerir que os condôminos se cotizassem e pagassem para instalar na casa do rapaz uma sala à prova de som.Os pais do garoto não aceitaram.Tal atitude que iria “abafar” o talento de nosso artista em franca expansão...
U’a manhã, Seo Osvaldo saindo apressado de casa,atrasado para o trabalho, não vê Marcelo passando de bicicleta por trás do carro e o atropela.Foi um acidente banal.Não para o nosso Gene Krupa canarinho e à mãe do garoto, que ficou aos berros ao constatar que o filho havia quebrado um dos braços.
Mais tarde, serenado os ânimos e depois de levar o rapaz ao hospital,ele volta com o braço engessado.
No condomínio não se falava em outra coisa:o acidente no qual Seo Osvaldo havia quebrado o braço do baterista.
O que se notou em seguida,nos dias que se seguiram,foi o silêncio que no condomínio voltara a reinar.Nas manhãs de domingo já se podia ouvir os pássaros cantando ,o vento sussurando nas árvores...Dir-se-ia um Éden...
De fato,há males que vêm pra bem. O acidente com o garoto trouxera além da imobilização do seu braço o silêncio e a paz que há tempos os moradores imploravam..
Mas a paz tinha os seus dias contados.Logo que tirassem o gesso do rapaz, certamente,tudo voltaria a ser como era antes.
Os moradores marcaram então uma reunião extraordinária.Tudo muito sigiloso e ‘as escondidas, somente com aqueles diretamente ligados ao “problema” A pauta:um sorteio.Um sorteio sub-reptício para ver quem seria o próximo condômino a atropelar Marcelinho.
Houve uma grita geral,mas acabaram concordando que não haveria outra forma de conter aque monstro de bumbo e baqueta.
Só Seo Osvaldo que não entrou:”Eu já fiz a minha parte,agora é com vocês!” disse rindo.Sem querer mas fiz...
Depois que Marcelinho foi atropelado ”acidentalmente” uma segunda vez, seus pais resolveram mudar do condomínio, para júbilo, prazer e glória dos moradores.
Junto ao caminhão da mudança alguém deu a idéia de fazer um bolo para comemorar o aniversário do “Seo” Osvaldo. Eu desconfio, pois que eu saiba “Seo” Osvaldo só faria aniversário dali há 3 meses.