CONVENÇÕES ESTAPAFÚRDIAS

O ano 2019 terminou em trinta e um de dezembro. Mesmo?

É claro que se formos buscar correspondências lógicas, não há nenhum ano começando em janeiro e terminando em dezembro, e tem mais:

- O papa Gregório XIII, para estabelecer o calendário que usamos hoje, teve de eliminar dez dias, pulando de 04/10 para 15/10. E as diferenças astronômicas ainda persistem.

- O ano 2019 é contado a partir da suposta data de nascimento de Jesus, só que não há nenhum consenso imbatível quanto a essa data, mas já se sabe que a admitida é errada.

- A maioridade legal e penal em 18 e 21 anos valeram-se de estudos antigos, e não refletem a realidade cognitiva e procedimental dos jovens atuais. Pode-se citar a quantidade de estudos comportamentais em andamento (mais de trezentos) em diversas universidades do planeta, tendendo a reconhecer como novo patamar, algo em torno de 14 a 15 anos.

- Os doze anos de educação básica, preparando o jovem para ingressar na universidade, já não parecem tão necessários, pois já se provou, em projetos experimentais vários, que alunos bem alimentados e sadios, conseguem absorver todo o currículo proposto em só oito anos.

- Vários tipos de roupas e acessórios, como ternos, paletós, gravatas, camisa e sapato social, só foram instituídos como exigíveis, em ambientes de trabalho ou reunião protocolar, porque os europeus, que ditavam as convenções nos séculos 19 e 20, assim estabeleceram. No entanto, é possível e recomendável que, em nosso clima, deixemos de lado essas tolices e usemos algo bem mais leve, versátil e saudável, mesmo que preservando bons costumes.

- Excelência, meritíssimo, senhoria, e outras excrecências convencionais, nenhuma utilidade possuem, e ainda servem para alimentar o ego de pessoas que usam de alguma autoridade legal, facilitando a corrupção, a impunidade e o desvario com as verbas públicas.

- Burocratizar, criar comissões, agências, sindicatos, associações, movimentos e outras tantas iniciativas fragmentárias, além de atravancar qualquer deliberação e atividade fim, ainda impõe, convencionalmente, um caminho tortuoso para a mais simples das atividades, teoricamente, para evitar abusos ou desvios, e, usualmente, são essas que os praticam mais amiúde.

- Convencionou-se que a democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo. Na prática porém, é o governo do interesse de uns poucos, em detrimento da maioria; partidarizado, em sua estrutura política, e blindado contra qualquer insurreição popular. Isso significa que o povo é um incômodo para quem diz legislar, justamente, para ele. Já ouvi “autoridades” dizerem que os legisladores não foram eleitos para fazer a vontade do povo (?), que as escolhas do povo são estranhas e têm de ser controladas (?), que quem decide são os eleitos, e ponto final (??).

- A própria constituição define que o povo pode governar através de eleitos ou “diretamente”, e que todos os princípios democráticos de respeito à vontade popular majoritária devem sempre ser respeitados. Em caso de dúvida, existe a figura do plebiscito popular para definir. Todavia, quando se fala em plebiscito, são muitas as vozes que gritam: “Golpe!” Curiosamente, quando as autoridades contrariam a vontade popular majoritária e seus anseios, esses mesmos gritões se calam e até compactuam com desvios cívicos. Oligarquia plena?

- Quando os populares insatisfeitos formam uma maioria significativa, e não enxergam luz no fim do túnel da corrupção, desmando, corporativismo e quadrilhagem, passando a citar, gritar por intervenção militar, crendo que só assim se varrerá do poder a impunidade bandida, voltam os gritões e muitas “autoridades” a condenar quem assim age, chamando a todos de golpistas. Porém, a intervenção militar é outra ferramenta democrática, justamente para corrigir abusos e desvios daqueles que, usufruindo do poder e sua imunidade, agem contra a vontade popular.

- Temos, atualmente, dezenas de ditaduras vigentes no mundo, entre teocráticas, comunistas, pseudo-democráticas e tribais (para simplificar). Interessante notar que, ao invés de vermos os gritos de “Golpe!” endereçados a esses regimes, sabemos que os ataques visam os governos que, mesmo que não sejam plenas democracias, ao menos ensaiam o respeito ao Estado de Direito. Como nos acostumamos às convenções, acreditamos que ditaduras são democráticas e democracias (mesmo rastejantes) são autoritárias.

Não preciso que concordem com o que digo, porque não exponho opinião ou ponto de vista, mas apenas realidade factual. Não me interesso por defender ninguém, em especial, mas lançar à vista de todos como nos acostumamos às convenções mais torpes, aos interesseiros de ocasião, e somos obrigados a obedecer quem não merece, sequer, consideração.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 02/01/2020
Código do texto: T6832660
Classificação de conteúdo: seguro