Amar ao próximo como a ti mesmo.

O poeta nos ensinou que "nenhum homem é uma ilha". Em verdade, há em nós uma necessidade premente de interação social, e assim formamos família, estabelecemos amizades, trocamos afeto e somos capazes de construir microcosmos em lugares remotos.

Penitenciárias são ilhas construídas pelo homem para isolar o próprio homem. No cárcere, todo tipo de sentimento germina e prolifera como erva daninha.

Alguns dizem que aqui fora, a sociedade liberta vive em estado de praga biológica, incapaz de reconhecer que não faz mais do que reproduzir condutas totalmente desprovidas de discernimento. E os poucos que se dizem despertos, desenvolvem universos paralelos que, na maioria das vezes, acaba por isola-los ainda mais da multidão de almas zumbis que perambula pela vida sem se dar conta de que está apenas sobrevivendo.

Mas há um homem que nos tem provado por muito anos ser alguém fora da curva. Alguém que escolhe diariamente estar desperto para escutar e compreender o que se passa nas ilhas que o homem constrói como forma de contenção de tudo o que é feio, transgressor, inapropriado, violento e indigno.

Seu nome é Antônio Drauzio Varella. Um médico oncologista, cientista e escritor brasileiro, que nesta semana comoveu milhares de almas zumbis ao oferecer um abraço a outro ser-humano que se encontra em estado de isolamento físico, social e afetivo. Seu nome é Suzy, mas a maioria de nós não se importaria em chamá-la de lixo humano.

Suzy é uma mulher transsexual que cumpre pena no Estado de São Paulo. Como sou alguém extremamente privilegiada e não posso sequer imaginar as experiencias já vividas por Suzy, não tenho vocabulário que descreva com o impacto necessário, o que seus olhos gritaram quando faltou-lhe folego para se estender ao afirmar que não recebia visitas na cadeia a quase 8 anos.

Solidão. Esquecimento. Desamor. Desalmados são aqueles que a abandonaram. Família, amigos, laços de afeto estabelecidos quando Suzy ainda se encontrava no meio de nós, almas zumbis. Todos a esqueceram.

Mas Suzy está viva em algum lugar deste mundo. Ela respira, conversa, trabalha e fala de si mesma com uma voz que transparece resiliência. Sua essência é feminina e marginal. Sua alma é oceano. Posso apostar que é. Anseios de aceitação, respeito e amor. Superação diária frente a uma realidade de provações aparentemente infindáveis.

Existe uma migalha de Suzy em cada uma de nossas pequenas e ordinárias frustrações, mas será que existe um pouquinho de Drauzio Varella em nossas ações?

Lorena de Macedo

@lorydmacedo