Post Verissimo

O momento de maior inspiração é inversamente proporcional ao momento de maior lucidez em qualquer aspirante à artista. No nosso momento de maior fraqueza emocional que conseguimos exprimir o que de mais belo, fugaz e poético carregamos. Porém, da pior maneira possível. O que deveria ser uma agradável brisa de amor de verão se transforma numa epopéia onde, se um dos amantes não sai morto, pelo menos termina eternamente amaldiçoado pelo então cônjuge, e ambos sofrem com a abstinência dos efeitos do tempo, que, todos sabemos, na realidade sempre acaba agindo, abrandando feridas emocionais. O tempo murcha as plantas que deixamos de regar. Apesar disso, naquele momento, quando com lágrimas escorrendo pela face já vermelha e inchada, o escritor deixa o corpo desabar sobre a cadeira e exprime seu material, o resultado que obtemos toma caminho completamente inverso. E o excretor da odisséia ali, vociferando, baforando, expelindo fumaça de cigarro ou sentindo o estômago retorcer em decorrência da quadragésima dose de uísque, acreditando piamente que de suas mãos saiu obra incomparável, crendo nas cifras que seu sofrimento reverterá mais do que crê em Deus. Vai dormir - quando consegue - crente de que aquele pandemônio abriu caminhos até então barrados em seu cérebro, que a glândula pineal realmente existe, que o mito do uso limitado das capacidades mentais pelos seres humanos até tinha um fundo de verdade, mas ele, exclusivamente ele havia sido o primeiro a passar por cima de todas as suas funções orgânicas e gerar uma obra prima inigualável. Pois bem. Dê a ele dois dias, uma ressaca e uma releitura, e você verá o olhar de triunfo transformar-se em duas sobrancelhas arqueadas em susto, e após o quedar da musculatura das costas, apenas uma frase que resume todo o lapso criativo:

"Meu Deus do céu, que merda!".